sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Saudade do que poderia ter sido e não foi...

Ao constatarem quem é o autor dos poemas abaixo, não estranhem!
Eles bem representam a opção de um momento vivencial, uma circunstância de vida, uma história existencial, uma lembrança mantida viva, uma fonte de satisfação e orgulho por escolhas feitas.

Algumas vezes me pego refletindo sobre quantas pessoas tiveram na vida um encontrão, do qual resultou uma certeza de que valeria a pena ter investido nessa relação, e dela fugiram? Mesmo ante circunstâncias favoráveis ao redor, na época da ocorrência, se amedrontaram e não confiaram na própria capacidade de construir uma convivência serena, debaixo de uma cumplicidade fiel e leal?

Acredito que muitas conhecem a dor da saudade, do que poderia ter sido e não foi ...
E carregam dentro de si a tristeza da sensação de alguém , que poderia ter sido tão significativo em sua vida, estar tão longe, distante...
E convivem com o paradoxo da alegria de senti-lo tão presente dentro da ausência.

No entanto, poucas carregam no peito o enorme prazer de perceber, e constatar, semelhanças.
Sintonia e sincronia de valores e virtudes, que pouco sobressaem numa sociedade como a atual. O que faz valer a frase popular: "É como encontrar uma agulha num palheiro".

É difícil se enganar ante as evidências de pontos em comum, como o resgate da "dignidade humana"; a luta pelo "ser livre e feliz"; o fascínio pela "verdade e justiça", "amor e solidariedade"; o desejo de contribuir para o "bem estar social".

Esse é o espírito que envolveu a escolha desses poemas sobre o "Amor". Eles bem representam, a meu ver, o maior perigo num envolvimento amoroso:


"Amor é fogo que arde sem se ver"

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade
É servir a quem vence, o vencedor,
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade;
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?"


"Se pena por amar-vos se merece"

Se pena por amar-vos se merece,
Quem dela livre está? Ou quem isento?
Que alma, que razão, que entendimento
Em ver-vos se não rende e obedece?

Que mor glória na vida se oferece
Que ocupar-se em vós o pensamento?
Toda a pena cruel, todo o tormento
Em ver-vos se não sente, mas esquece.

Mas se merece pena quem amando
Contínuo vos está, se vos ofende,
O mundo matareis, que todo é vosso.

Em mim, Senhora, podeis ir começando,
Que claro se conhece e bem se entende
Amar-vos quanto devo e quanto posso.


"Transforma-se o amador na cousa amada"

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si sómente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim co'a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como matéria simples busca a forma.


O nome de seu autor é: Luís Vaz de Camões


Ah, a dor da saudade do que poderia ter sido e não foi!
Por vezes, o peito aperta e sangue parece brotar do coração ferido.
No entanto, não se pode deixar de reconhecer que, uma saudade assim, não deixa de colorir o aqui e agora de existências humanas voltadas ao encontro da própria integridade e dignidade interior.

Mas, querem saber, hoje em dia duvido, que alguém deixe de lado um amor, mesmo quando o encontrão impactante o pegar desprevenido!

Aurora Gite

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