segunda-feira, 24 de março de 2014

Responsabilidade sobre a identidade no meio da atopia e acronia

"Uma identidade no meio da atopia e acronia", ou como atualizo,  "Responsabilidade sobre a identidade no meio da atopia e acronia"


Confiram porque republico! 
Verifiquem se não é uma leitura pertinente, que produz reflexões incisivas sobre a responsabilidade que temos nas escolhas, que recaem sobre o aqui e agora de nossas experiências. 

Somos, nesse momento, "livres no que diz respeito às tomadas de decisões", que interferem diretamente sobre o lugar ideal em que optamos por nos posicionar em nosso viver, e sobre a herança que almejamos deixar como legado público, patrimônio que decorre da construção de valores de nossa história pessoal, inseridos no quebra-cabeça da sociedade que vivenciamos. Porém não me parece que tenha havido época em que a liberdade tenha incomodado tanto o ser humano.

São muitas as opções de escolha em meio ao mundo de incertezas em que temos que mergulhar, visto terem se dissolvidos grande parte de nossos referenciais tradicionais ou de autoridades responsáveis por nossa segurança. Temos que bancar quem somos, escravos de nossas imperfeições e nossos medos, e lutar por fortalecermos nosso mundo mental para obter maior equilíbrio entre um controle emocional sobre nossos afetos, e disciplina-bom senso-temperança sobre nossas escolhas racionais.

Republico, atualizando esse post e agregando essa indicação:
http://www.cpflcultura.com.br/ "As Novas Fronteiras da Subjetivação", palestra do psiquiatra e doutor em Medicina Social, Benilton Bezerra Jr, parte do módulo sob sua coordenação intitulado "Os Efeitos Psicológicos da Crise"
ou www.youtu.be/AwOlzQ7OiwE via@YouTube
ou via google - nome da palestra - entra no youtube e é só selecionar

Tenho me detido a rever atentamente essa palestra. Assisti a esse longo vídeo (por volta de 2 horas de duração) mais de uma vez. E, a cada vez, novas perspectivas me são abertas pelas análises de Benilton, demandando novas articulações de minha parte e profundas reflexões. A sensação de "quero +", em seu término, me indica que tenho que agregar "coragem e audácia", para mobilizar meu psíquico e articular meus pensamentos, adotando postura disponível a seguir o raciocínio analítico de Benilton sobre o social que nos confronta. 

Confesso que fui atrás de mais dados sobre o "homem grávido Thomas Beatie". Fato real de um transexual (linda mulher, miss Havaí, que opta por se transformar em homem cirurgicamente, faz masectomia, mas se recusa a tirar o útero, pois quer "engravidar" e ser pai) - leiam a história real e vejam a foto de Beatie grávido, pesquisando no Google. Acredito que esse caso, em particular, exemplifique os paradoxos referenciais que tenhamos que lidar a partir de toda liberdade conquistada.

Acredito que a 2ª parte da palestra de Benilton, espaço dedicado aos debates com a platéia, apresentem outros questionamentos a respeito desse caso, com novos pontos de vista que nos levam a refletir e indagar: Por que um transgressor de tradições, que opta por uma vida cheia de aberrações, tende a querer formar uma família após esse longo percurso (Beatie se casa, a esposa toma hormônios e amamenta seu filho etc...)? Aonde estará nos conduzindo nossa sociedade em meio a toda essa anomia individualista e narcísica?

Aí foco novamente sobre a "Responsabilidade sobre a Identidade no meio da Atopia e Acronia" e direciono vocês a confrontarem dois testemunhos de figuras públicas, dois exemplos de posturas de vida que decidiram por caminhos bem diferentes um do outro. Não sei com qual vocês vão se identificar mais.

Uma Identidade no meio da Atopia e Acronia, post datado de 07 de dezembro de 2011, continha o que se segue: 

Primeiro duas indicações se fazem necessárias, uma entrevista e uma palestra, mobilizando grandes reflexões sobre o mundo atual e sobre nosso papel neste social virtual:
1- http:// www.tvcultura.cmais.com.br/rodaviva/fernando-henrique-cardoso lançando também seu novo livro "A Soma e o Resto: um olhar sobre a vida aos 80 anos".
2- http:// http://www.cpflcultura.com.br/ "Espaço, Tempo e Mundo Virtual" palestra de Marilena Chauí realizada em Campinas em 02.09.2010 e reprisada em 29.11.2011.

Confesso que ainda estou muito apreensiva com as atribuições humanas outorgadas a essa nova categoria de seres, com os quais vamos ter que conviver: os robôs. Dessa vez, não me refiro a massa humana robotizada, não! Eu me refiro a essas máquinas, cuja tecnologia formata, cada vez mais, à imagem humana. Acredito que a gravidade desse confronto ainda não foi abarcada.

É grande o poder que o homem entrega para as novas tecnologias em prol do progresso. Inquieta, me questiono a que se refere tal progresso, já que a humanidade perde cada vez mais sua dignidade e autorrespeito, e ganha em desesperança e violência, facilmente observadas em nosso quadro social globalizado.

Os homens, a cada dia, mais se desvalorizam e se sentem impotentes frente à máquina pensante computadorizada, cujo valor de entrecruzar dados e raciocinar globalmente é inegável. O pior, a meu ver, é que todo esse processo se dá de maneira racional e voluntária. O mais surpreendente é que os homens não são forçados a se colocarem dependentes de máquinas para tudo. O mais espantoso é que desaprendem habilidades tão simples que envolvem um prazer tão corriqueiro. O espaço da imaginação criativa cede para a inércia destrutiva da condição humana saudável - física, psíquica e espiritualmente.

Ah! Gandhi e seu tear, em sua sabedoria e abertura de espaço interno para reflexões e cultivo de valores pacíficos de convivência...
Coador de pano e espremedor manual de laranjas para a refeição da manhã? Que mundo é esse se contrapondo ao mínimo esforço de realizar as mesmas tarefas com cafeteiras e espremedores elétricos cujo "único" problema vai advir com a falta de eletricidade? Aliás, se vier a faltar, a maioria da nova geração (e muitos da velha) fica perdida, e apela para a padaria da esquina.

Pensar na vida, se questionar sobre o futuro, se inquietar com conceitos abstratos como justiça, verdade, transparência, honestidade, dignidade, ética, humildade, gratidão? Que valor tem esse blá-blá-blá no mundo atual sem quadros referenciais que possam servir de apoio, que possam se constituir em pilares para um amadurecimento psíquico necessário para assumir os "nãos" na colocação dos limites pessoais, para um fortalecimento interno contra a raiva das frustrações, para um crescimento e valorização individuais que impulsiona ao "basta", para se afastar e lutar por deixar de ser peça de engrenagem nesse social contemporâneo desumanizante e robotizado.

Homens se desumanizam, embotam seu sentir e desativam seu pensar ... robôs se humanizam, "aprendem a ter emoções", a reagir a elas adequadamente, a sorrir, a falar, a abraçar, a pensar, a articular pensamentos buscando soluções inteligentes, a realizar atividades de forma independente. Uau!

Como o exército de homens, atualmente sem valores humanos referenciais, enfraquecidos em sua auto-estima, inferiorizados em suas competências, incapacitados para viver fazendo parte de equipes, irá, algum dia, enfrentar esses monstros, que se agigantam com feições de anjo e estruturas metálicas recobertas - desenhadas para se aproximar mais e mais da imagem humana com qual finalidade a não ser narcísica? - e aos quais a tecnologia instrumenta, atualmente, até para serem violentos na defesa de suas autonomias e autoprogramações para se tornarem mais humanos?

As análises de Chauí a colocaram numa posição de excluída desse social sem a força referencial das tradições, não encontrando espaço ou tempo para manifestar sua identidade já formada e assumida. Suas considerações sobre a atopia e acronia advindas com o mundo virtual, através do qual se constata a dissolução das distâncias relacionais e do embaralhamento do tempo presente-passado e futuro - tudo se resume na proximidade do outro num "agora" virtual - a levam a assumir sua impotência pessoal para se colocar nesse mundo. Coloca sua curiosidade para acompanhar e ver a maneira através da qual a nova geração vai enfrentar o novo mundo que a espera.

Como o ser humano vai despontar a partir desse "agora - não real" ? A que valores condicionará o seu existir? Essa inquietude também me contamina e angustia.

"Não real", pois não se observa a existência dos limites perceptíveis do humano. Portanto, sem as características dos cinco sentidos e até da capacidade intuitiva, que envolvem a percepção humana, a nova geração vai demandar da criação de novos referenciais e novos paradigmas na invenção de uma identidade humana, que a faculte sobreviver no mundo contemporâneo, e nele construir sua história de vida. Em outras palavras, que a possibilite colocar sua essência na forma de seu existir nesse mundo, obtendo uma qualidade de vida satisfatória e prazerosa.

Vale assistir ao vídeo da palestra de Chauí e estar atento a sua citação inicial e devidas considerações sobre a "fenomenologia da percepção", título também da obra do pensador Merleau-Ponty, que tão bem analisou a fenomenologia existencial que envolve o homem e o social.

Por outro lado, Fernando Henrique Cardoso serve de um excelente contraponto a essa posição de expectadora dentro de uma perspectiva passiva , e se coloca como o pensador atuante que, mesmo com seus 80 anos, não abandona a postura empreendedora e busca continuar a construir a história de sua vida com orgulho e dignidade, inclusive numa participação ativa em prol de um social melhor.

Fica visível na entrevista (link acima citado) sua função pública e o peso de seu papel como político. Vale rever e analisar como se faz a própria história de vida, e como essa escrita independe até da idade cronológica com suas limitações naturais.

Da postura de Fernando Henrique Cardoso retiro como mensagem: "Não vai ser fácil a inclusão no social virtual. Cabe a cada um abrir seu espaço: não sem antes encontrar a si mesmo na utopia e acronia virtuais". Nesse sentido, dou ênfase às suas colocações sobre o papel das redes sociais em sua vida, já dimensionada em sua plenitude e dignidade.

Vale assistir ao vídeo dessa entrevista. Depois reflita sobre como ela repercutiu dentro de você.

Ah! Não deixe de comparar os dois conteúdos, que se complementam em muitos aspectos.
 Estou curiosa para saber sua opção de como pretende colocar seu existir, no mundo virtual atual.

Aurora Gite

segunda-feira, 17 de março de 2014

Mais uma vez Hannah Arendt, por que não?

Há algum tempo nosso quadro sociopolítico tem atraído minha atenção, e não é sem espanto que acompanho todo o processo de alienação atual. 

Pessoas preguiçosas em seu 'pensar por si', tendo por referência e menosprezando o grande desconforto que contamina a si e grande parte dos que estão ao seu redor, se escorando na covardia não ousando mobilizar a coragem necessária para correr o risco de saindo do lugar de vítimas, enfrentarem e interromperem o 'status quo' desgastante. 

Mudar padrões de submissão vigentes, e se colocar na posição de agente social efetivo de mudanças eficazes, são como quê, as palavras chaves e o processo central da dinâmica, que custa a emergir e encontrar expressão social, visto o vozerio popular, já gritar por socorro para não sucumbir de vez às zonas de conforto da tutela do "poder totalizador" (semelhantes aos das grandes ditaduras, dos regimes fascistas e nazistas- Arendt os descreve bem, inclusive por tê-los vivenciado):

 * o "fenômeno do lulismo", ou da abrangência, a cada dia ganhando mais espaço social, de um "regime totalitário" centralizador dos processos decisórios, controlador do marketing e da difusão de ideias, mais e mais distorcidas, de uma esquerda antes preocupada com o bem coletivo, pois hoje se tornou um movimento partidário que se preocupa mais em unificar diferenças, amordaçar a voz dos discordantes, atropelando a verdadeira política,

* a "robotização humana à mercê das ideologias partidárias", que mais e mais tendem a implodir uma frágil democracia, tentando se equilibrar para fortalecer seu caminhar, visando incluir ampla participação popular nos processos decisórios da nação e resgatar o espaço para que a voz dos cidadãos seja ouvida e respeitada,  

* a "convicção, ou crença, de atuarem com dignidade e posturas éticapartidárias", como é o caso de um dos mensaleiros, que prova viver sem grandes ostentações e demonstra, no seu caso, ausência de desvios de dinheiro visando vantagens pessoais, valia a honra de tudo ter sido feito pelo partido político, 

* ministro do mais alto escalão do judiciário, por perfeccionismo burocrático, com vaidosa pompa e ilustre verborragia na defesa de leis, esvaziadas da verdadeira justiça por não mais condizerem com a realidade social, surdo ao quase maciço clamor público, vota a favor daqueles que comprovadamente lesaram o social; embora atento à certeza de que medidas como embargos, serviriam para manipulações perversas questionáveis de profissionais que, não se omitiam de manobras afrontosas ao próprio Direito e à Justiça, se bem remunerados,

* por aí pode-se discorrer sobre vários fatores que lesam o quadro social com sua impunidade, favoritismo e nepotismo, opressão escravizante pelos altos impostos cobrados dos cidadãos e pouco retorno de benfeitorias sociais, podem ser relacionados evidenciando os motivos da insatisfação popular com um governo, que peca pela má administração do patrimônio público, pela falta de habilidade nas negociações políticas, pela dificuldade de lidar com divergências ideológicas e articular argumentos ideativos sem se utilizar de barganhas e favores ilícitos, por envolverem a falta de transparência e uso indevido do que é público.


Aí me volto a Hannah Arendt (1906-1975), ante minha inquietação e indagações sobre até quando persistirá nossa desumana degradação social, até quando ainda irá ocorrer essa "alienação e descomprometimento social com mudanças", quando emergirá um verdadeiro líder político, que possa resgatar os valores que mantém uma sociedade unida e íntegra moralmente falando? 

As ideias de Arendt ressoam em meus ouvidos: 

* "A Política baseia-se na pluralidade dos homens devendo, portanto, organizar e regular o convívio dos diferentes... Ela surge não no homem, como afirma Aristóteles, mas sim entre os homens."

* "O sentido da Política é a liberdade... A liberdade e a espontaneidade dos diferentes homens são pressupostos necessários para o surgimento de um espaço entre eles, onde só é possível a verdadeira Política...A Política tem uma dignidade própria"

* "A Lei produziu o cidadão, agente de mudanças sociais. Arendt destaca, no entanto, a distância entre a intenção e o discurso, que além da capacidade da retórica, envolve a faculdade de persuasão e o poder de convencimento. O discurso é que faz do homem um ser político. O que os homens fazem, pensam ou experienciam só têm sentido (significado) na medida em que podem ser discutidos entre eles." 


E eu a me perguntar de onde surgiria o líder pacificador no momento atual, que tenha condições, com a força de seus argumentos, de mobilizar a desalienação popular e agregar a coragem de várias mentes pensantes e autônomas, com cacife para bancar suas individualidades e sua vontade de lutar, tendo por armas a credibilidade de exemplos em seu modo de viver, reforçada por argumentos convincentes e irrefutáveis na pontuação de vantagens, em prol da defesa do Regime Democrático de Direito ? 

Aqui associo (coincidência?) as circunstâncias atuais com o movimento da Revolução Francesa e sua eclosão ante o clímax da insatisfação popular... degradação humana, escassez e fome... lançamento de pães, que não mais saciavam a ânsia do povo, que não mais escondiam seu furor ante a falta de reconhecimento a suas necessidades básicas de sobrevivência, que não mais encobriam o desprezo pelo pouco caso e pela opressão humilhante, pela forma como a realeza menosprezava a condição humana, em seus pilares de sustentação: a liberdade, a igualdade e a fraternidade, que vieram a se constituir em lema da Revolução.


E lá vem Hannah Arendt mais uma vez!

"Entre o Passado e o Futuro" , não é um livro fácil de ser lido, mas nos confronta com algumas verdades dentro de perspectivas pouco comuns.

Arendt chama nossa atenção para o erro da "engenharia das relações humanas" e sua forma ineficiente de lidar com a "administração das questões humanas". Combate a maneira de "tratar o homem como um ser inteiramente natural, cujo processo de vida pode ser manipulado da mesma maneira que todos os outros processos (artificiais).

Aponta o perigo do mundo atômico em seu agir na natureza, onde "não são mais as ações humanas, mas o mútuo relacionamento que pode mudar e muda historicamente"; onde "o geral confere sentido e significação ao particular". Para ela, " processos invisíveis engolfaram todas as coisas tangíveis e todas as entidades individuais visíveis, degradando-as a funções de um processo global... levando ao desencanto do mundo ou alienação do homem". Nesse sentido, "o processo (abstrato) é que torna por si só significativo o que carregue, adquirindo um monopólio de universalidade e significação".

Nessa moderna maneira de pensar, "nada é significativo em si e por si mesmo, nem mesmo a história e a natureza tomadas cada uma como um todo". E eis o homem atual entregue a um agonizante desamparo e profundo desespero.

Ao mesmo tempo, nos confronta com a oposição entre a prática e a teoria; entre a vida sensível e perecível, envolta pelo "erro e ilusão dos olhos corpóreos", e a verdade permanente, imutável e supra-sensível, cuja compreensão é guiada pelos "olhos do espírito, ouvidos do coração e luz interior da razão". Esses opostos "somente tem sentido e significação em sua oposição" e não por si sós.

A articulação de ideias de Arendt, em sua análise histórica e perspectiva filosófica e política, me fascina e me enche de esperança em um futuro melhor para a humanidade.

Assim segue a autora, em suas reflexões: "É como se Platão estivesse dizendo a Homero que não é a vida das almas incorpóreas, mas sim a vida dos corpos que tem lugar em um mundo inferior; comparada com o Céu e o Sol, a Terra é como o Hades; imagens e sombras são os objetos dos sentidos corpóreos, não o ambiente das almas incorpóreas. O verdadeiro e real é, não o mundo em que nos movimentamos e vivemos e do qual temos que partir na morte, mas "as ideias vistas e apreendidas pelos olhos da mente". É como se o mundo interior do Hades houvesse ascendido à superfície da Terra."

Continua traçando um "paralelo entre as imagens da Caverna de Platão, em sua parábola, e o Hades de Homero - os sombrios, irreais e insensíveis movimentos das almas no Hades - que correspondem à ignorância e inconsciência dos corpos na Caverna".

Recorda o Mito da Caverna de Platão, onde a cada reviravolta do homem ocorre a perda de sentido e orientação, onde " os olhos ajustados são ofuscados pela luz que ilumina as ideias, necessitando reajustar-se; e os olhos ajustados (posteriormente) à luz do Sol, devem reajustar-se à obscuridade da Caverna".

Relembra esse mito onde em uma primeira reviravolta os habitantes da caverna, presos por grilhões que os obrigavam a ver somente a tela à sua frente, com as sombras e imagens projetadas, quando deles se libertam e se voltam para o fundo da caverna se deparam com um fogo artificial que ilumina as coisas dentro da caverna tais como realmente são. A segunda reviravolta está atrelada à saída de caverna para o céu límpido, onde as ideias aparecem como as verdadeiras e eternas essências das coisas na caverna, iluminadas pelo Sol, a ideia das ideias, que possibilita ao homem ver e às ideias brilhar. A terceira decorre da necessidade de volver à caverna, de deixar o reino das essências eternas e novamente se mover no reinos das coisas perecíveis e homens mortais.

Assim para Hannah Arendt, os homens socializados decidiram jamais deixar a "caverna" dos assuntos humanos quotidianos, se permitindo a atitude de "espanto face ao que é como é".

Eis porque defendo o espaço para que os "unicórnios" (princípios virtuosos éticos) se aproximem e possam se agrupar fortalecendo nossos campos mentais, iluminando a riqueza ética do mundo psíquico dos seres humanos, propiciando interações harmônicas e respeito às diferenças individuais, metas públicas voltadas ao bem estar coletivo, convivências políticas mais serenas, onde reine o bom senso e a diplomacia nas negociações que envolvam questões sociais conflitantes.

Eis porque entrego a vocês como presente uma ampulheta (vide blogs anteriores), outra forma simbólica de representar o tempo na atitude interna da transcendência humana implícita na caverna, sua saída e posterior entrada buscando propiciar que os demais possam se libertar da condição de escravos e, por livre arbítrio, possam vir a constituir - ao abandonar a sua alienação dentro de um mundo fictício, frágil e superficial por ser tão artificial - uma "sociedade realmente humanizada".

Aurora Gite
* (2009 ou 2014...recorram à carruagem do tempo e observem como as ideias de Arendt fazem parte da paisagem que pudemos, e podemos, contemplar através de suas análises sociopolíticas, que envolvem a condição humana)

terça-feira, 4 de março de 2014

Papel da Psicologia no novo milênio

Que pena que não tenha tido espaço para escuta por parte de meus pares - em sua maioria freudianos, lacanianos e voltados à teoria dos campos - no grande complexo hospitalar, do qual fiz parte por longos anos! Quantas pesquisas poderiam ter sido realizadas, se não tivesse havido a fixação na preservação da Psicanálise tal qual Freud a delineou em teoria e técnica, e o enquadramento de supervisões e pesquisas sob o prisma psicanalítico dentro de variações respeitando as correntes psicanalíticas mencionadas acima. Na época, minha bagagem psicanalítica, em nada ortodoxa, se voltava mais para as ideias kleinianas. 

No entanto, já era conhecida minha disponibilidade para a compreensão de novas visões psicoterápicas, cujos resultados positivos evidenciassem sua eficiência. Destaco que paga-se um preço alto "entre os pares" por assumir como profissional - e defender - essa postura eclética, que acredito ser indispensável nos dias de hoje (século 21). Confesso que senti um pouco 'na carne' os efeitos maléficos, e ainda conservo as marcas em minha alma, da rede de intrigas que envolve os que resolvem se bancar preservando a dignidade de sua singularidade - como  Melanie Klein, citada abaixo. 

Após a morte de Freud, em 1939, as ideias de Melanie Klein foram questionadas, passando ela a "ser vítima de maldade destilada de boatos aceitos como fatos... estando em jogo o poder e a futura organização da Sociedade Psicanalítica... ao lado de questões centrais sobre a difusão e a transmissão da psicanálise".(Colao, Magda M., na Jornada Psicanalítica: 02.06.2011, Porto Alegre). 

Vale fazer constar, também citação de Colao, que o biógrafo de Melanie Klein, Phyllis Grosskurth, ao iniciar sua obra: 'O mundo e a obra de Melanie Klein' (p.7.), escreve sobre as primeiras palavras que Klein ouviu Freud pronunciar: 
 "Nunca nos vangloriamos de possuir um saber  e uma capacidade definitivos e completos. Estamos tão dispostos agora, quanto estávamos antes, a reconhecer as falhas de nosso conhecimento, a aprender coisas novas e a modificar nossos métodos de qualquer forma que possa aperfeiçoá-los." 
 (Sigmund Freud, Linhas de Desenvolvimento em Terapia Psicanalítica, 1919

Por outro lado, realço que "o novo já nasce velho quando setores arcáicos permanecem no poder" defendendo teorias inquestionáveis sobre o ser humano, esquecendo que outras visões, sobre os dinamismos que cercam a condição humana, podem surgir graças a novas tecnologias imagéticas e recentes descobertas sobre as mobilizações da energia psíquica. Não há mais como não adotarmos visões teóricas mais ecléticas, escolhendo, em nossas práticas clínicas, técnicas e instrumentações que mais se adequem à demanda, e ao momento de vida, de quem nos procura.
Uma era com tantas e tão rápidas transformações nas relações, como essa advinda com esse milênio, nos obriga, como profissionais da área de saúde mental, a estarmos sempre abertos a reciclagens teóricas e a atualizarmos nossas posições na prática clínica, ao nos confrontarmos com a eficiência e eficácia dos novos conhecimentos aplicados sobre a mente humana. É fácil observamos a evidência de seus efeitos positivos na conquista de maior autoconhecimento, liberdade na tomada de decisões mais conscientes, responsabilidade constante nas ações voltadas à defesa e manutenção de uma vida mais qualificada, contribuindo para um indivíduo e uma sociedade mais harmônica e feliz.
Republico a postagem abaixo, pois acredito ser importante, no momento, agregar à minha pesquisa a Física Dra. Danah Zohar e sua visão revolucionária da natureza humana e da consciência baseada na nova física, buscando somar seus conhecimentos à minha hipótese sobre ter sido Freud o primeiro a observar os efeitos quânticos e intervir no inconsciente, que, a meu ver, corresponde a operações psíquicas dentro do "caleidoscópio inteligente" de nossa energia "quanta".

Sobre o papel da Psicologia no novo milênio

União da Psicologia e Física Quântica: Novas leituras.

Algumas considerações de Danah Zohar, física e filósofa -casada com o psiquiatra, psicoterapeuta e escritor, Ian Marshall - retirados de seu livro “O Ser Quântico" (já citado em posts anteriores de 2008)

“Uma psicologia da pessoa, baseada na natureza quântica do ser, enfatiza todos os relacionamentos e assenta o indivíduo, em virtude de sua própria natureza, no mundo do ser. Para tal indivíduo, cujo compromisso com os outros, com a natureza ou com valores espirituais está na essência de sua existência, não poderá haver uma base para distúrbios narcisistas de solidão, vazio, alienação ou envolvimento consigo mesmo...Estar envolvida consigo mesma é, pela própria natureza do ser, estar envolvida com os outros".

"Numa psicologia quântica, não há pessoas isoladas. Existem indivíduos, que possuem identidade, significado e propósito, mas, como as partículas, cada um é uma breve manifestação de uma particularidade. Essa particularidade está em correlação não local com todas as outras particularidades e, em certo grau, entrelaçada a elas".

"Apenas responsabilidade dá significado e valor a nossa existência. Mas em que medida podemos fazer face a ela? Se uma psicologia do compromisso e da responsabilidade quiser ter algum valor em si mesma, deverá levantar a questão da liberdade humana, a questão do grau em que qualquer um de nós é livre para se comprometer como quiser, ou assumir a responsabilidade que é nossa por natureza. Portanto, uma psicologia quântica dever adotar alguma posição quanto à realidade e eficácia da escolha".

"Estou convicta de que temos hoje na física quântica os fundamentos de uma física sobre a qual podemos basear nossa ciência e nossa psicologia, e que através de uma comunhão da física e da psicologia também poderemos viver num Universo conciliado, um Universo em que nós e a nossa cultura seremos plena e significativamente parte do esquema das coisas".


Zohar, Danah.O Ser Quântico: uma visão revolucionária da natureza humana e da consciência baseada na nova física. 17ª edição. Rio de Janeiro: BestSeller, 2008.
“ Uma obra sobre a vitalidade da nova física e seu poder de combater a alienação e a fragmentação da vida moderna, substituindo-as por um modelo de realidade em que o próprio universo possui uma consciência – e a humanidade é somente uma de suas muitas expressões.”
Aurora Gite