domingo, 14 de agosto de 2011

Resgate do "espaço do sujeito" na organização

As gestões participativas, com seu discurso de transparência, organograma hierárquico horizontal e programas de formação de lideranças, mudou a forma de interações na empresa. A demanda atual clama por novas leituras e interpretações do capital humano.

Projetos programáticos, planejamentos estratégicos e logísticas operacionais passam a ter por meta : impedir a queda das produções interativas, o despencar das ações humanas no bloco das bolsas das equipes, e o enfraquecimento de seus pesos atitudinais e valores morais.

Crises de estabilidade advém das mudanças estruturais ocasionadas pela alteração do tradicional eixo de hierarquia vertical (chefias/subordinados) para o eixo horizontal das gestões participativas (lideranças/colaboradores) e das equipes formando times. Convém ter sempre presente que qualquer mudança estrutural no trabalho representa uma ameaça real, risco de demissão ou remanejamento de funções e locais; e, também, perigos fantasiosos, ampliados por desvalias e inseguranças pessoais, gerando muitas fofocas e uma rede de intrigas. Essas futricas danosas, que a má fé e o mau caráter se incumbem de espalhar, em mãos de "perversos, narcisístas e maquiavélicos", travam o fluxo de informação e ocasionam a distorção na comunicação e na percepção da realidade.

Comunicação truncada, falta de coerência intencional nas mensagens, embotamento afetivo, ansiedades persecutórias, sensação constante de ameaça à integridade do prestígio funcional, posturas vingativas e "puxadas de tapete" baseadas em fantasias subjetivas, reações agressivas e impulsivas sem medir consequências morais: eis o início da descapitalização do patrimônio humano na empresa, e da maquiavélica manipulação "psicotizante" . Distanciado dos princípios racionais da realidade e próximo dos delírios (alterações nos juízos) e das alucinações (alterações nas percepções), o "sujeito" dentro de cada pessoa, independente de seu lugar no organograma institucional, perde seu espaço.

Ante a realidade, cindida e embaralhada, muitos para a própria sobrevivência psíquica e preservação no quadro organizacional, passam a desconsiderar dados racionais e sequências de fatos reais. É o apego a sua razão e valorização pessoal interna, que podem mantê-los com o pé na realidade da situação vivida. É alto o custo para se preservar íntegro, conviver pacíficamente e sobreviver psíquicamente num ambiente onde predominam mensagens ambivalentes do tipo "Faça o que eu mando, mas não o que faço"; "Estou indo, já passei meu cartão (na entrada ou na saída, ou em ambas), mas você não me viu!"; "Não alterei o horário de 9:00h, mas mande a mensagem que a reunião de diretoria passou para o período da tarde, pois, como assessora, não quero a presença dele".

Não se pode ocultar que grande dificuldade, quanto a limites na empresa, reside na ignorância sobre a competências de ações do próprio cargo, falta de conhecimento que interfere na seleção de profissionais. Engenheiros montam "desenhos operacionais" voltados a padronizações e robotizações, priorizando a validação produtiva para a empresa (seu patrão) e obedecendo suas diretrizes. Considerar o espaço de sujeitos é com recursos humanos? Esquecem que organizações dependem dos fenômenos sistêmicos e demandam uma visão holística para sua compreensão como um todo de partes interdependentes em constante dialéticas, trocas que podem alterar substancialmente a produtividade da empresa e a fidelidade da clientela, se suas influências negativas não forem detectadas precocemente. Por exemplo, um mau atendimento de um porteiro pode afetar emocionalmente um cliente, influenciando seu modo de interagir com o ascensorista, se estendendo a recepcionista... e nessa sequência interferindo até na escuta aberta em reuniões e importantes tomadas de decisões.

No esquema de autoridade vertical, a meritocracia é de quem impõe suas ordens e obriga seguidores a obedecer. Quer maior fator desmotivador para uma colaboração voluntária ? Na transparência da gestão participativa, o mérito recai sobre a competência do colaborador em determinada função e para isso tem que haver a preservação de seu espaço como "sujeito", abertura para sua individualidade criativa e inovadora, reconhecimento real e gratificante do seu desempenho na solução do problema empresarial.

Como atuar então?
Investir diretamente contra chefia, ou por meio de queixas formais?
Vai cair na avaliação de inadequação e rebeldia a figuras que representem autoridade; sem programas de treinamento poderá passar a remanejamento ou afastamento direto da empresa.

Como fazer para resgatar éticamente o "espaço do sujeito" na organização?

Ante esse quadro situacional e motivacional eis dois mapeamentos que podem servir se procura também esse resgate. Em ambos pode-se observar a coleta de sugestões e a implicação do sujeito resgatando sua história dentro da empresa e seu cuidar da empresa que o acolhe.

Vou transcrever sem a formatação estética e espaços que tal mapeamento demandaria. Em ambos espaços, na parte superior da folha, para os dados referentes a: data, serviço, setor, cargo, tempo de serviço, sexo, idade, estado civil, escolaridade, religião.

* Questões para um MAPEAMENTO SITUACIONAL

1- Cite 3 (três) características pessoais importantes para o funcionário que ocupa este cargo e 3 (três) que atrapalhariam seu bom desempenho.

2- Apresente 2 (duas) sugestões, ou mais, possíveis de serem implantadas nesse momento, que poderiam facilitar o serviço de quem exerce esse cargo. Justifique.

3- Segundo você, o que poderia dificultar sua implantação, no momento atual?

4- Defina com uma palavra o que "um trabalho" representa para você.

5- Cite uma imagem que represente o "seu trabalho atual" e justifique a escolha.


**Questões para um MAPEAMENTO MOTIVACIONAL


I -"Eu trabalho nesta empresa porque..."
( Marque os pontos mais importantes do motivo de trabalhar nesta empresa. Escolha até no máximo 5 (cinco) alternativas, numerando por ordem de importância.)

( ) 1- Tenho chancer de crescer na empresa.
( ) 2- Tenho estabilidade no emprego.
( ) 3- Por falta de opções.
( ) 4- Tenho muitos amigos aqui.
( ) 5- O ambiente físico do trabalho é bom.
( ) 6- O ambiente humano do trabalho é bom.
( ) 7- O trabalho que faço é interessante.
( ) 8- O salário é bom.
( ) 9- Os benefícios são bons.
( )10-Tenho liberdade para apresentar sugestões.
( )11-Gosto do que faço.
( )12-Porque me dá prestígio.
( )13-Porque seria difícil conseguir um emprego melhor.
( )14-Porque o mercado não está favorável a mudanças.
( )15-Por outro motivo. Qual?

II- Sem ser aumento de salário, cite 3 benefícios importantes para você.

Vai se surpreender com os dados que vai obter!

Sobre essa base poderão ser construídos programas mais eficazes e mobilizadores da motivação dos colaboradores dentro de uma gestão participativa. Agora é mãos a obra e enquadrar a investigação do capital humano de sua empresa nesse esquema, priorizando os aspectos específicos, que caracterizam sua organização: perfil, valores e missão, política interna e externa.


Boa sorte em seu empenho por essa conquista em prol de um social mais humano! Aurora Gite

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Fábulas? Ora fábulas...

Muitos se perguntariam o que são fábulas? Para que servem essas pequenas estórias?
Procurando nos dicionários vão encontrar: "curtas narrativas que nos brindam com lições morais".
Pesquisem agora "La Fontaine", esquecido pelo tempo ou afastado na memória de muitos, conheçam suas fábulas, que dão vozes aos animais e nos trazem tantos ensinamentos, muitos de grande ajuda em dinâmicas de grupo.

Eis uma de suas fábulas, qualquer semelhança com chefias manipuladoras e autoritárias, ávidas de poder e prestígio, é mera coincidência. As metáforas, que contém, possibilitam tratar pacíficamente temas delicados para muitas organizações particulares ou institucionais. Essas expressões figurativas, que permitem substituição por analogias, podem ser recurso de grande valor. Para exemplificar, lembram da frase "forte como um leão"? Na fábula abaixo, volto a enfatizar, será mera coincidência quaisquer comparações com a postura ditatorial de muitos diretores de grupo, que me permito não chamar de líderes de equipes? Analogias... ora analogias!


"A novilha, a cabra, a ovelha e o leão"

Três animais muito pacatos - a novilha, a cabra e a ovelha - fizeram certa sociedade com um feroz leão, o rei daquela floresta.
Pelo acordo feito entre os quatro animais, quaisquer lucros ou prejuízos de um deles deveriam ser partilhados pela sociedade.
Logo depois de celebrado o trato, a armadilha da cabra conseguiu apanhar um veado, e o animal imediatamente mandou chamar seus sócios.
Todos apresentaram-se, e o leão, deixando aparecer suas afiadas garras, disse: - "Somos quatro a partilhar a presa".
Era uma afirmação desnecessária, mas o rei fez questão de fazê-la para demonstrar que ele presidiria a partilha.
Esquartejando rapidamente o veado, com sua longa prática, o leão tomou a primeira parte para si e disse:
- "Não há dúvida de que o primeiro bocado é meu, porque me chamo leão e sou o rei da floresta. E creio também que nada poderão dizer contra a decisão de pertencer também a mim o segundo pedaço, pois é pelo direito do mais forte. Exijo também o terceiro, porque todos sabem ser eu o mais valente. E aquele que tocar na quarta porção será dilacerado por meus dentes."

Quem não se confrontou, no organograma hierárquico, com o balançar de um crachá marcando território? Quem não se deparou, impotente, com projetos de equipe sendo esquartejados e partes sendo divididas em benefício de chefias, que tomam posse do projeto e da equipe, e assumem a autoria pelo poder que o cargo e o mau caráter lhe outorgam? E quem não ousou se rebelar e se viu dilacerado profissional e pessoalmente? Estão de prontidão, para dar o bote, o assédio moral, a calúnia e o baú com estoque de represálias, que dilaceram inescrupulosamente a posição, e até a moral, dos indivíduos perante a equipe e a empresa.

Leis... ora leis! Evidências são evidências, plantadas ou forjadas: ora...ora... é melhor deixar como está e agir com inteligente logística estratégica "não ir contra, mas obedecer as ordens, de quem está no poder"! Nem pensar em questionar quem é o dono da organização e fazer valer seus direitos, mesmo porque danos morais são difíceis de se provar. E a justiça de nossos tribunais precisa de fatos, de provas legais, que constem das leis transcritas, elaboradas por homens da nossa sociedade. Não votou nos vereadores, deputados e senadores? Eles são os políticos que cuidam da "coisa pública", ou deveriam cuidar.
Transparências nas ações políticas... ora... ora... tá lá no papel e nos discursos por votos!
Transparências em gestões participativas... ora transparências!

E tem mais, para abrir qualquer ação jurídica é preciso dinheiro... advogado sai caro, sabia? E se a negociação não der lucro, vem o famoso: "Aconselho a deixar tudo como está!" e o sábio vaticínio (profecia) "Vai ter mais aborrecimentos, pode acreditar!"
Justiça... ora Justiça!
Verdade... ora Verdade em sociedades, humanísticas e democratas, de mentirinha!

E a pergunta que não quer calar: " O que fazer?"
A resposta vem da esperança que brota do peito, querendo explodir: "Tem que haver um jeito, tem que ter algo a se fazer, para não ser enterrado vivo e sucumbir renascendo como mera peça dessa engrenagem social deteriorada".


domingo, 7 de agosto de 2011

Gerações perdem o "olhar da ternura"?

Outro dia folheando a revista Psique me deparo com uma crônica de Rubem Alves, que logo me despertou o interesse. Como sempre faço, procurei saber quem era: escritor, educador e psicanalista. Depois busquei ler outras crônicas do autor, para verificar se o impacto se repetia em mim como leitora. Senti o mesmo prazer, o mesmo gozo ante a observação de uma sincronicidade de idéias. Senti meu coração alegre, ao me ver comovida por uma sensação de felicidade, ante a constatação de sua grandiosa simplicidade poética, sua facilidade de expressá-la e sua coragem de se expor.

Esses são os encontrões significativos da vida. Sincronicidade de idéias e vivências aproximando duas pessoas físicamente distantes e estranhas. Duas mentes que se entrelaçam no mundo abstrato e invisível do pensamento, na metamorfose do momento pelo dinamismo da energia emitida por um escritor e captada por um leitor, aberto à leitura e assimilação da mensagem expressa em palavras. Ops! Não sou uma mera leitora, busco o mundo de significações atrás desses símbolos gráficos e estabelecer uma vinculação afetiva, com quem escreve, pelo sentido oculto pelas representações.

A primeira crônica que li desse autor me fez escrever esse tweet:
"A troca de vivências com significados semelhantes é um dos fatores que traz proximidade e aconchego nas interações humanas".

Alves abordava a errônea expectativa que avós e pais depositam em ser compreendidos, esquecendo que novas gerações farão recortes, leituras e interpretações diferentes das deles. Por mais que recebam educação familiar semelhante, o desenvolvimento de seu potencial inato depende das interações com os grupos sociais e das aprendizagens históricas advindas da cultura e época vivida.

Ah, mal-estar da civilização! Quanta barreira, enjaulando a espontaneidade e autenticidade!
Ah, atual avanço tecnológico e rapidez na velocidade das informações, afastando ainda mais as gerações e dificultando a inserção de pais e avós no mundo digital e robotizado dos jovens!
Ah, como está cada vez mais difícil o encontro da sensibilidade do poeta, da coragem do herói para saber se expressar e ser reconhecido, correndo o risco de ousar se expor num mundo que lhe é adverso, como império da racionalidade padronizada de "logísticas estrategistas"!

E, de repente, surge um desconhecido em suas crônicas, que nos diz ao ouvido como num sussurro, assim preferimos escutar suas palavras, para que o vento não as leve no mundo descartável de hoje:

"Vou falar mal do telefone celular. Faz tempo, comprei um, daqueles pesadões, hoje elefantes se comparados aos mais modernos, pequenos beija-flores que se seguram delicadamente com o indicador e o polegar. Sinto-me humilhado pela comparação. (...) O meu, neste momento em que escrevo, não sei onde está. Também não adianta. Está sempre desligado. Acho que não quero ser encontrado. Psicanalista, tenho o costume de ficar interpretando os objetos. (...) O simples ato de atender ao pequeno aparelho pode ser, na visão psicanalista, a expressão que a pessoa faz do seu próprio poder"... muitas se colocando desrespeitosamente "no centro de sua bolha narcísica" ao atender e conversar em meio a palestras, por exemplo.

Os valores e limites racionais entre as gerações estão cada vez mais caóticos. Está cada vez mais difícil de se encontrar um sentido humano na linguagem expressa pelo social atual, com o aumento da violência e a banalização da vida, com o mérito atribuído à competitividade não digna e à submissão destrutiva do outro para abrir um espaço nessa "selva de pedra".

E, de repente, um psicanalista que se diz sensível, a ler fascinado metáforas, que envolvem ternura e "tanta alegria, tanta saudade, uma eternidade inteira num grão de areia", as transformando em crônicas:

"O amor dos dois surgira na adolescência.(...) Aconteceu com a jovem o que seus pais sugeriram: ela se casou. E ele também se casou (...) Quando ele tinha 76 anos ficou viúvo. Quando ela tinha 76 anos e ele 79, ela ficou viúva.(...) Ela não resistiu. Foi à sua procura. Encontraram-se. Resolveram se casar. Os filhos protestaram. Os filhos, todos os filhos, não suportam a ideia de que os velhos também amem. (...) Viveram um ano de amor intenso que provocou metamorfoses: ele se descobriu poeta, começou a escrever poesia."

Acham estranho ou bizarro? Talvez esse juízo surja nos que Alves chama de "analfabetos no olhar". Ele relembra Nietzsche que dizia que a "primeira tarefa da educação é ensinar a ver". Na crônica "A Arte de Viajar" escreve: "Quem sabe ver está sempre viajando, mesmo que não saía de casa. (...) Não é necessário escolher o destino certo, desde que se saiba apreciar o momento."

É se permitir sentir a "pureza singular da ternura" que, segundo Alves, flerta entre as dores do amor e a ardência sexual da paixão. O amor começa quando colocamos uma metáfora poética no rosto do amado ( da mulher amada)... quando observamos olhos, que nos fitam e dizem: "Como é bom que você existe..." Não há tédio, ou egoísmo depressivo, que resista a esse chamado, se não houver clausura voluntária no egocentrismo.

Cito outra crônica de Rubem Alves intitulada "A Ternura". Que pena que essa geração de interações digitais, marcadas pela distância interpessoal e mascarada pelo biombo da tela de um computador, nem saiba o que é cativar.

Termino com a resposta de Rubem Alves sobre o que é cativar, que cita uma de minhas obras favoritas "O Pequeno Príncipe" de Saint Exupéry ( e, para quem não leu ainda, indico A Arte de Amar, de Erich Fromm):

A raposa pediu que o Pequeno Príncipe a cativasse.
"- O que é cativar?" perguntou o Pequeno Príncipe.
" - Cativar é assim", explicou a raposa. "Eu me assento lá longe e você se assenta aqui. Eu olho para você e você olha para mim. No dia seguinte nos assentamos mais perto. Eu olho para você e você olha para mim. Até que nos assentamos juntos. Se você me cativar eu pensarei em você, conhecerei o ruído dos seus passos e sairei da minha toca quando você chegar..."
Aconteceu então que o Pequeno Príncipe cativou a raposa. O tempo passou e chegou um dia em que ele disse à raposa:
"- Preciso ir..."
A raposa disse: " - Vou chorar..."
" - Não é culpa minha. Eu não queria cativar você. E agora você vai chorar... O que é que ganhou com isso?"
" - Ganhei os campos de trigo", disse a raposa.
Antes os campos de trigo não comoviam a raposa. Agora, como são dourados como os cabelos do Pequeno Príncipe ganharam um significado.
"- ... quando o vento bater nos campos de trigo eu me lembrarei de você e sorrirei".
O rosto do Pequeno Príncipe estava gravado no trigal. Mas isso só o apaixonado vê." (...)

E assim encerra Alves: "É o olhar do apaixonado que torna o outro belo. Porque não vemos o que vemos; vemos o que somos. Uma mulher é bela quando nos vemos belos ao olhar nos seus olhos."

Com tristeza constatamos que, cada vez mais, essa geração perde essa grandeza do encontro da ternura e da beleza desse olhar terno, que nos contagia e ajuda a pacificar nossos conflitos e domesticar nossas intolerâncias.