sábado, 29 de novembro de 2014

Continuo dizendo que "Tudo valeu a pena!"...

Mais um final de ano que se aproxima! Como não reaver na memória "O que fazer?" e não reacender o afeto por quem o escreveu?

Compartilho as dicas, continuando a dizer, para esse ano também, que "Tudo valeu a pena!".

SEXTA-FEIRA, 27 DE JANEIRO DE 2012

" O que fazer?"

O que fazer?


Para associar mundo moderno com viver bem
Não basta tentar,
Temos que ir muito além.
Há três tipos de pessoas
Que vale a pena conhecer:
O modernista, o campista
E o que sabe bem viver.

O primeiro adora tecnologia.
Para ele, computador
É coisa de magia.
Mas não deixa a cidade grande.
Para ele, viver bem
É nada mais, nada menos
Que fama, poder e dinheiro.

O segundo é o tipo fazendeiro.
Trabalhou a vida inteira
E ganhou muito dinheiro.
Com trinta anos se aposentou.
Uma fazenda comprou
E muito bem se casou.
Qualidade de vida para ele
É ser rico e bem casado,
Ter fazenda e muito gado.
E viver bem relaxado.

O terceiro é bicho estranho.
Mas vale a pena mostrar,
Pois tem muito valor
No que estamos a falar.
Este sabe misturar
Viver bem e na cidade morar
Tem casa na cidade
E outra linda no campo.
Gosta de gastar,
Mas não tem dinheiro no banco.
Trabalha no que acha legal,
Mas o que ganha é muito mau.
Casou-se com quem ama,
Passa o domingo na cama.
Gosta de trabalhar,
Mas odeia o chefe encontrar.
Não sabe se vive bem,
Mas de uma coisa está certo:
É muito nervoso,
Mas é feliz também.

Agora, cabe a ti escolher
Qual dos três você quer ser.
Para quem não sabe o que fazer,
Saiba que minha opinião já fiz:
O que mais quero é ser feliz.

Luis Felipe Cyrillo Danezi
em seus 12 anos de idade
publicado na Revista de sua escola


Vale como lembrete para que os adultos não se esqueçam de seus sonhos e de quem realmente foram e poderão ser.

A dica da vida não é que procuremos nos adaptar às circunstâncias ao nosso redor, administremos nossos medos - como o medo do amor e de ser feliz - ou gerenciemos nosso "eu" em prol do bem viver de acordo com a expectativa de sociedades com normas, valores e preconceitos instituídos antes mesmo de nela existirmos. Não são as circunstâncias responsáveis por quem somos. Nosso "ser no mundo", com qualidade de vida, está atrelado a outras forças internas.

A mensagem que a vida nos envia é para respeitarmos com lealdade a pessoa que, em essência, existe dentro de nós; é confiarmos em nossa liberdade e capacidade para transformarmos o que nos cerca; é termos coragem dentro da simplicidade de buscar que nossa existência se adapte a quem realmente somos; é sermos fiéis a nossos sonhos sem medo de ser feliz.

É podermos olhar para trás e sentirmos profundo orgulho por termos nos permitido lutar por nossos sonhos, buscando suas inserções na realidade, em vez de termos vivido dentro deles, como sonhadores com medo de viver, o que a vida nos encaminha.

E, se a vida nos encaminha, faz parte de um mistério, a ser enfrentado e desvendado.
Qual são os primeiros passos a serem dados?
  • Encontrar e acolher o menino que todos temos dentro de nós.
  • Sair da bolha sonhadora, que mina a esperança de realizações ocorrerem; que eterniza o tempo, mas paralisa nosso andar por ele. E que susto ao vê-lo ter passado tão rápido!
  • Colocar os pés no mundo real, buscando na dignidade pessoal alcançada, a força e o equilíbrio para caminhar.
  • Dar sentido e qualidade a nossa vida, para nos aproximarmos da grandeza do bem viver.
  • Resgatar e agora sim vivenciar os sonhos, não tão esquecidos assim dentro de todos nós.
A partir daí, mãos à obra!
Posicionar sua tela mental, pegar o pincel de sua imaginação e delinear o esboço do que quer para sua vida. A cena onde seu desenho vai ser formatado vai depender da paisagem de seu cotidiano, mas as cores, que darão força à imagem que vai surgir, vão depender de suas escolhas e de sua vontade para decidir sobre quais delas vai querer que façam parte de sua criação, de seu viver a partir de agora.

Aurora Gite

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Lemos o mesmo livro? Vamos assistir ao mesmo filme?

Já começou a divulgação do próximo lançamento em fevereiro de 2015 do filme, baseado no livro "Cinquenta Tons de Cinza".

Há algum tempo venho consolidando meu ponto de vista sobre que o que me fascina no ser humano é a diversidade de perspectivas, enorme gama de pontos de vista e opiniões sobre uma mesma temática. Agrego agora que o que me atrai, curiosamente, é acompanhar no vácuo da mente as interações (quânticas) da energia psíquica, pulsando afetos - os mais diversos. Nesse sentido, continuam as investigações e descobertas, da Física Quântica e da Parapsicologia, sobre os fenômenos do teletransporte quântico e da telepatia a nível do deslocamento da energia psíquica entre os seres humanos. Muitas teorias espiritualistas antigas, começam a ganhar uma evidência e compreensão lógica ante os novos focos dessas ciências. Agora é questão de tempo!

Isso me é suficiente? Não.
Cada vez mais não se consegue separar e compreender o indivíduo fora do coletivo; fazer uma leitura das energias (cósmicas?) que cercam os seres humanos sem interligar o "micro ao macrocosmo"; acompanhar o trajeto físico e as repercussões psíquicas das interações prazerosas, tanto no tesão corporal quanto no elo tensional do que chamamos "vida" e "amor", através de meros recortes da realidade. Tudo está em movimento que, por vezes, ganha um dinamismo próprio que amedronta. Tudo está interligado e conectado, de tal forma que nosso equipamento lógico, mesmo intuitivo, não abarca ainda!

Mais ainda, os recursos de nossa imaginação, ou faculdade (aptidão inata) de imaginar,  não são adequadamente usados para nos permitir um bem viver dentro do real entediante, cruel se vivenciado a dois. Podemos sonhar e idealizar, em nada se aproximando de fugas alienatórias e sem desestruturar esquemas de valores, que sustentam nossa fragilidade humana mas que nos fazem viver uma vida a dois insignificante e infeliz. Muitas vezes, somos obrigados a reconhecer nossas limitações concretas e aceitar que relações são parcialmente gratificantes e necessárias a suprir aspectos práticos da vida. Mas não podemos negar que nosso viver ganha novo colorido e nos impulsiona a evoluir como pessoa, se recorrermos ao nosso imaginar criativo e inovador, que nos leva a viagens (quânticas?) atemporais. Existe uma energia (campo do psiquismo?) que pode trazer o passado e antecipar o futuro, entortando a rede circunstancial do presente, como os físicos já estão delineando experimentalmente. O importante é sempre manter a "razão" como "líder mental".

Ter conhecimento da dinâmica que envolve a vida a dois ainda não ganhou a primazia devida na vida de um casal. Poucos se atêm a importância de uma escuta apurada e respeito às necessidades e limites do parceiro buscando encaixes mais harmônicos dentro do convívio conflitivo natural em toda vida de relação. A quebra dessa escuta é, a meu ver, o fator primordial para o distanciamento entre os parceiros e o isolamento e direcionamento para um convívio com a solidão interna, para se proteger de sofrimentos ante futura prenunciada exclusão da união afetiva insatisfatória.

Quando ambos ousam enfrentar seus fantasmas internos, buscar ajuda necessária, ter coragem para procurar mudar em prol de si mesmos, têm chances de crescer como pessoas na vida a dois. Fecham as saídas da sofrida solidão interna, obstáculo intransponível na construção da vida de um casal ao se enclausurarem em seus mundinhos particulares excluindo o parceiro da relação conjugal, ou se aliando, de maneira egoísta, a terceiros, que passam a representar oportunas bengalas. Ambos, carregam vida à fora um vazio existencial que se expressa no tédio e falta de sentido para viver; a esses tanto a trilogia Cinquenta Tons de Cinza, como o filme a ser lançado em fevereiro de 2015 são motivos de desconforto e críticas portanto.

Relembrando considerações que fiz ao término da leitura de trilogia, procurei trazer também o relato de meu estado de espírito afetado, indiscutivelmente, pelo conteúdo da obra. A cada livro lido ia colocando minhas impressões. A postagem sobre "Cinquenta Tons de Cinza" data de setembro de 2012; sobre "Cinquenta Tons Mais Escuros" ocorreu em outubro de 2012; e sobre "Cinquenta Tons de Liberdade" em dezembro de 2012. Sendo assim, como não compartilhar?

19 DE DEZEMBRO DE 2012


Cinquenta Tons de Liberdade

Encerro a leitura da trilogia "Cinquenta Tons" de E.L.James e me ponho a digerir sobre o que ficou dentro de mim.

Começo por três pontos, a meu ver, básicos:

Primeiro, dou ênfase à qualidade da publicação da editora Intrínseca e à escolha das capas, não só pelas imagens, mas pela textura das mesmas.

Segundo, realço o estilo de escrever de James com sua objetividade, frases curtas, indo direto ao que quer transmitir, sem a necessidade que o leitor tenha muitas elucubrações e interrogações do tipo "o que será que o autor quis dizer com isso?". Acredito que, além do conteúdo instigante, essa forma sucinta e direta, tenha atraído tantos leitores "internautas do mundo atual", que se dispuseram a comprar seus livros e a seguir avidamente suas idéias, bem articuladas dentro do que a autora se propôs.

Terceiro, leitores em busca de pornografia, podem ter se deparado com muitas lições de como atuar sexualmente, ante descrições tão detalhadas e ricas sobre a relação sexual entre duas pessoas "afins uma da outra", que se perceberam com uma química semelhante, com seus corpos respondendo a estimulações específicas de forma idêntica - sintonia que aumentou a atração entre eles - e com suas mentes se permitindo  se embalarem no aumento de prazer, pela excitação advinda da atuação da faculdade de imaginar, fervilhante de inovações consensuais impeditivas a que o tédio da mesmice contamine o tesão que  apimenta a relação; digo melhor, que poderia apimentar o tesão de qualquer relação humana nesse sentido.

Agora chego ao que me causou grande surpresa: Quanta coisa sobre o "amor" , para os que se dispuserem a ver +além das meras aparências!

"Data venia" aos que tenham opinião contrária, chamou minha atenção, logo no início da leitura da trilogia, a autora usar a expressão "fazer amor" em vez de fazer sexo. No sexual temos o êxtase do prazer orgástico, explosão de energias através da entrega a uma união de corpos que se abre ao estímulo de áreas eróticas e à excitação pela fricção das mesmas. No "fazer amor" temos a entrega ao prazer de duas almas afins, o "sentir", em breves momentos, o clímax (apogeu) de energias em campo que irradia paz, aconchego, amor.

Refletindo sobre a repercussão e o estouro nas vendas da trilogia "Cinquenta Tons", mais me convenço sobre a pobreza da fantasia no erotismo atual. Ao ler não se sobressaiu o encontro sadomasoquista e a relação de prazer ante dores físicas e/ou psíquicas, mas o consenso e a curtição de um casal no encontro de jogos eróticos, que liberam a sintonia da excitação de suas libidos. Inclusive, quem se dispôs a ler e confrontar a obra com tantas críticas cruéis, deve ter notado que entre o casal existia um código: o uso da palavra "vermelho", indicava o 'Pare!', simbolizando, naquele momento, a interrupção de como chamavam de seu "desafio de limites". Meu foco recaiu na preocupação de um com o bem-estar do outro, na enorme vontade de agradar e preservar, no afetuoso e raro cuidar das respectivas integridades psíquicas.

Notem como a autora articulou suas idéias, sempre mobilizando o interesse para o "quero saber mais" e a curiosidade no "e agora, o que vem?" , dentro de situações banais que poderiam ocorrer com qualquer um, e sob uma abordagem bem passo a passo da relação sequencial das cenas, que levam a seguir seu pensamento e o desenrolar das ações dos protagonistas.

Analisem o "subjugar": não implica em causar sofrimento, mas aumentar o prazer da entrega, após o jogo da resistência e controle das reações imediatistas, impulsivas. Verifiquem a "função da submissão" onde o aumento do tesão vem do tentar se esquivar, sem impedir a ação restritiva do outro, mas encorajando-a. É incrível como os casais menosprezam suas capacidades de imaginar e fantasiar, apimentando a vida sexual, e  se permitem cair no marasmo tedioso da mesmice.

A expressiva vendagem dos livros ("pornografias para mamães?", subtítulo que receberam) e o interesse de tantos jovens, podem sugerir a possibilidade de maior união da "sensualidade" à "sexualidade", ou seja, que a mera satisfação dos instintos sexuais se acopla à grandeza das descobertas dos prazeres sensuais, pela entrega gradual aos estímulos sensoriais: aumento da percepção sobre as sensações físicas. O que me parece um bom sinal para impedir a alienação do mundo da ilusão,  com suas criações em que impera a falácia fantasiosa sobre as sensações reais.

Termino a leitura e me recordo que a autora se permitiu "criar", concretizar suas idéias, sob o som da música clássica, fato que também atraiu minha atenção. Minhas pesquisas sobre os dinamismos energéticos de nossa energia psíquica, os associando a processos bio-quânticos (bio-eletromagnéticos) estavam sendo direcionadas para os efeitos internos da acústica dos sons: de um som lírico e suave (mais atrativo à nossa alma) e sua diferenciação com um rock da pesada ( mais estimulante a movimentos corporais). Começo a ler de Otto Maria Carpeaux, "O Livro de Ouro da História da Música", onde o autor "traça a história da música erudita através de sete séculos.

Ao fechar "Cinquenta Tons de Liberdade" e me por a pensar sobre o trajeto dos personagens, vejo delineado o caminho por onde a autora impulsiona seus personagens a percorrer, que pode ser experienciado por duas pessoas viventes quaisquer. No possibilitar essa identificação também reside parte do sucesso da obra.

Mentalmente faço um retrospecto das articulações das idéias de James, que me levaram a refletir sobre:

* "a arte de amar", ou o respeito pelo cuidar das diferenças individuais e o encontro do prazer no ser diferente do outro e crescer nessa relação, preservando as individualidades;

* "a arte de fantasiar em consenso" como fator enriquecedor da relação;

* "a arte de criar expectativas", ou saber aguçar o prazer da espera de algo imprevisível e fora de controle;

* "a arte da entrega", ou o de se capacitar para o relaxar necessário a que a mesma ocorra com prazer;

* "a arte de confiar", de confiar no próprio taco para manter a relação e na capacidade do outro para lidar com adversidades circunstanciais do cotidiano, ambos preservando a relação para que não se contamine.

Essas reflexões me levam a recordar como algumas pessoas - como os personagens de James - ao se encontrarem circunstancialmente têm algum tipo de conexão energética ativada. É um reconhecimento inexplicável : "Não me pergunte o porquê, mas sinto nele a dignidade do diamante; se algum dia o souber 'solitário' e 'só'. vou estar por perto"; contrapondo a um " Ou ela é muito boa, ou muito..." já permitindo antever suas ansiedades antecipatórias, seus "cinquenta tons" a serem acolhidos.

Aqui já tirei da prateleira os "Diálogos de Platão" : "Banquete" ( com todo seu louvor ao amor) e "Fedro" (que prolonga o Banquete e vai +além) . Li o "Banquete" em 1976. Só de folhear percebo sua importância pessoal, por me permitir observar meu caminhar em relação ao fenômeno amoroso. Mas, de repente, em Fedro, do "mito do carro alado, no qual o cocheiro é a razão e os corcéis, a vontade e a concupiscência", me surge a percepção de que ansiedades antecipatórias em suas roupagens de medos do porvir, não só serão afastadas pela oposição ao que é no presente e pelo reforço ao confiar na própria capacidade de atuar sobre circunstâncias "conforme forem se concretizando no real", mas quando se alçar a categoria do cocheiro: da "razão" para a da "sabedoria".

Os mitos dispersos pela obra de Platão me fascinam. Talvez ouse estabelecer um código secreto, para quando se possa, ou se queira, acolher a privacidade de uma relação a dois, e falar "me too" (eu também).

Aurora Gite



sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Quando o texto tá difícil de entender...

"O texto tá difícil de entender, pode me ajudar a compreender o que eles estão transmitindo?"

Eis o tipo de ajuda que, provavelmente, tenho condições de contribuir. Ainda mais envolvendo Norberto Bobbio (1909-2004), Immanuel Kant (1724-1804), seus interesses primordiais em ética e política, onde as possibilidades de me acrescentar algo são enormes!

Agora é buscar nos comunicarmos adequadamente, para que possamos comungar ou compartilhar nossas ideias com as desses filósofos. Penso até que poderiam ser considerados co-autores do texto, por suas citações lhes facultarem uma participação relevante dentro do conteúdo do mesmo. Minhas pretensões passam longe de ensinar, passar informações, mas buscar essa comunhão de pensamentos entre leitores e escritores, que somos. É essa relação que me fascina!

Ante a gratificação de mão dupla, não há como recusar o pedido de ajuda informal. Dessa vez, a rede social facebook foi o recurso que serviu ao nosso intercâmbio. Lá comecei eu a responder sobre o texto encaminhado via e-mail e previamente lido. Como acredito que possa auxiliar outros, resolvi passar para essa postagem, com a dupla intenção de também poder resgatar para ler, quantas vezes tivesse vontade, sem ter que contar opcionalmente com alguma falha da memória, distorção que me faria ir atrás de outras fontes.

"Quando o texto tá difícil de entender, leia um parágrafo e tire uma palavra-chave, ou poucas palavras que representem 'para você' o que o autor quis transmitir. Assim, pouco a pouco, vá juntando as ideias principais do autor e acompanhe a trama de seus pensamentos. Quando leio, faço de conta que o autor está falando para mim. É assim que acompanho as articulações de ideias dele sobre o tema, buscando me engajar em seus escritos como leitora participativa, sempre curiosa com "E o que vem depois?" e sempre buscando preencher lacunas, porventura incompreensíveis, que possam distorcer o conteúdo que ele procura comunicar, como se fosse um interlocutor presente. Quando vem por metáforas, ou está mais oculto, na sequência sempre emerge uma associação que o torna mais explícito.

É uma outra curtição essa forma de se envolver como leitor... tente para ver! No início causa estranheza, pois precisa conter a ansiedade de abarcar tudo, de forma mais fácil e mais imediata. Mas vai valer curtir o tesão da aproximação, lenta e gradual, e da eclosão iminente do prazer de um insight compreensivo.

Por exemplo, no primeiro parágrafo, Bobbio (filósofo-político italiano considerado com "identidade neokantiana") pontua que "para elucidar o mundo contemporâneo, o pensamento iluminista é primordial".

No segundo parágrafo, Bobbio cita que, para Kant (filósofo alemão, cujas ideias muito o influenciaram), o Iluminismo "representa a  saída do homem da minoridade para a maioridade", conceitos que para ele refletem posturas de vida e escolhas existenciais. Superar a minoridade significa atingir uma liberdade interna para tomar decisões; responsabilidade de refletir sobre elas e as avaliar racionalmente e criticamente; e se bancar ao se comprometer com suas escolhas e consequências de prováveis resultados de suas opções. Assim surge o cidadão, inserido no coletivo, não mais dependente do referencial dos outros para ter voz ativa no social, mas que emerge como figura centrada em si mesma, opinando e votando sobre a forma de governo ou poder, que deve governar ou administrar o bem público.

Esmiuçando as ideias da primeira folha... são essas que coloquei acima. Agora vou para a segunda folha, tendo em mente que a ideia principal até agora foi a "importância da superação de menoridade pela maioridade". Por que? Porque na minoridade se é dependente do pensar dos outros. Na maioridade, já se alcançou a liberdade de pensar por si mesmo, tendo desenvolvido uma razão crítica pública, que possibilita avaliações mais realistas sobre o que ocorre dentro de si e ao redor de si, no mundo exterior.

Abro um parentese: Usando minha maioridade "eu penso que" a chave de tudo no mundo está em reconhecermos como somos afetados, ou nos permitimos afetar pelas circunstâncias internas ou externas.

Agora volto ao texto sobre Bobbio para seguir as ideias desse filósofo-político, curiosa para ver aonde ele quer me levar... No início da segunda folha, já vi que vai diferenciar governo democrático do governo autocrático. Dou uma paradinha e olho novamente o título desse texto "A Identidade Neokantiana de Norberto Bobbio: a ética-moral da paz e da guerra liberal-democrata", de autoria de Marcelo Lira Silva.

Já começo a articular! Liberdade (respeito com diferenças) articulo com Democracia ( convivência pacífica com divergências), com ética-moral da paz (maneiras de ser mais harmônicas e integradoras), com guerra liberal-democratas (com conflitos a serem superados buscando a união da maioria, do coletivo... ops, união não é fusão; fusão vem a dar em "massa padronizada" e não indivíduos agregados ao redor de um bem comum.

O texto sobre Bobbio e Kant não é de leitura compreensiva fácil mesmo, até pela complexidade temática. Sendo assim é preciso ir entendendo por partes. Primeiro resgatei quem foi Bobbio e  me interessei em saber como e onde Kant entrou em sua linha de pensamento ao analisar o quadro socio-político mundial.

Na página... você tem que Bobbio "evoca a razão política, assim como os princípios ético-moral kantianos, como formas resolutivas da paz e da guerra entre os Estados nacionais dos séculos XX e XXI". Segundo Bobbio, o caráter anárquico das relações internacionais de hoje, decorre da "ausência de um poder comum, "supranacional", que viesse regular e garantir o cumprimento dos pactos entre as nações".

Ops! Associei  a importância de um "poder comum supranacional" com as ideias do sociólogo Zigmunt Bauman e anotei um lembrete para revê-las após "dissecar" esse texto. Vários vídeos de Bauman se encontram disponíveis no Canal YouTube.

Volto a Bobbio, para quem "as relações internacionais repousam em um sistema de equilíbrio de poder", não podendo ser esquecidos os poderes invisíveis, ocultos. "Em termos kantianos, os Estados-nação contemporâneos não alcançaram a maioridade no nível das relações internacionais, onde o poder é, e só pode ser exercido através do uso público da razão".

Pausa para eu te lembrar que Kant privilegiava o alcance da autonomia, independência e liberdade internas para tomar decisões racionais, conscientes e responsáveis. Destacava a falta de coragem, a preguiça e indolência características da menoridade, afirmando que só saindo dessa postura interna e existencial de um individualismo mais egoísta, passivo e egocêntrico, seria possível - como indivíduo - pensar no coletivo e - como cidadão - atuar, tendo por foco o Bem Comum.

Volto ao texto: "Todo homem tem a possibilidade de diferenciar-se dos outros seguindo sua própria lei intrínseca (ou seja, sua natureza inata, seus valores, seu caráter) sua própria liberdade, e, portanto, pode ser avaliado de modo correspondente à sua diferenciação. Continua Bobbio, "A Justiça está na igual possibilidade de cada um usar sua liberdade... na igualdade para o uso do "livre exercício de expressar a própria personalidade" - no "como administrar vontades e interesses pessoais com todos os pactos sociais necessários, feitos na co-existência com outros indivíduos, no jogo de diferenças dentro da polis".

Vale destacar que " A Política (a gestão da coisa pública), entretanto, é permeada por conflitos irreconciliáveis, cabendo às partes resolver os conflitos através de uma pactuação, na qual a Constituição aparece como mediador de conflitos"...O contrato social de Kant depende dos indivíduos reconhecerem seus limites pessoais e estabelecerem normas universais, que sirvam para todos na vida pública. As regras ético-morais kantianas implicam no cumprimento de deveres e obrigações, certos tipos de coações práticas impostas ao homem por leis criadas por ele mesmo.

E aí é que começam os problemas! Continua Bobbio: "Se for verdade que o homem é um valor em si (que tem o que Kant chama de dignidade ontológica a respeitar)", que faz valer a sua vontade como se fosse uma legislação universal (ao usar racionalmente seu pensar voltado ao público), torna-se necessário saber "quem tem o poder e está autorizado (legitimado) a usá-lo em uma sociedade utilitarista como a atual. A igualdade (isonomia) e liberdade formal (decidir dentro das normas), garantidos pelos regimes democráticos contemporâneos, convertem-se em "desigualdade social", na medida em que, "quem está autorizado a transformar em legislação universal a sua vontade, são os que detém o poder econômico."

Sendo assim passa a imperar o confronto de interesses e vontades distintos, característico da sociedade utilitarista burguesa liberal, que a distancia da "ética kantiana, que compreende o homem como um valor em si, portanto, uma dignidade que não admite o estabelecimento de um preço".

Tô curiosa para ver a sugestão de Bobbio,  baseada no Projeto de Kant, que propunha o estabelecimento de uma "confederação de Estados", que desse vida e corpo político a uma "comunidade internacional", garantindo uma "paz perpétua".

De antemão, já adianto, como bem colocado no texto abordado, Bobbio aponta duas vias para conseguir isso que chama de "saúde da Democracia": a "ampliação dos Estados Democráticos"  e a "Democratização do Sistema Internacional" em seu conjunto. Essas vias deveriam caminhar de maneira "interdependente, conexas e inter-relacionadas: uma passaria a ser garantidora do complemento e constituição da outra".

Observe que interessante, para impedir invasões mútuas, a proposta é de um processo de "pactuaçôes": "primeiro um pacto negativo, de não-agressão; depois um pacto positivo de acordo mútuo e regras comuns a serem seguidas; e como último pacto, "acima das partes", o fazer respeitar os pactos, mesmo pela força da espada, se necessário. Bobbio defende uma "guerra justa", pois, a seu ver, essa guerra justa não é um momento contrário à política, mas é ela própria "o momento político resolutivo de conflitos".

Agora articulo eu!  Para que os pactos sejam respeitados é preciso que os homens saibam usar com inteligência seu lado racional, pensar com bom senso e ter diplomacia no agir com ponderação nas negociações da vida de relações internas de um país, ou nas que dizem respeito a suas relações externas, dentro da perspectiva internacional,  envolvendo outras nações com culturas sociopolíticas e economia tão diferentes...Esse é um grande desafio para o momento atual com tanta violência e desconsideração de pactos legais em diversas áreas.

Sendo assim também me aproximo esperançosa de Kant e resgato a Filosofia Iluminista que "parte da razão, como elemento essencial para o progresso da modernidade". Por que não seguirmos com Bobbio, neokantiano como caracterizado no texto, e endossarmos sua linha de pensamento para a saúde da Democracia no confronto com os desafios desumanos, desabonadores e vilipendiadores dos direitos humanos já no século 20, adentrando o novo milênio? Para ele, "A democratização das relações entre os Estados nacionais, portanto, constitui-se em baluarte (bandeira) da democracia. A Democracia assume assim um 'caráter civilizador'."

Não é tão fácil se implantar essa forma de governo, mesmo se reconhecendo a falência da maioria das gestões governamentais atuantes, haja visto o estado caótico globalizado. Não há nação que escape de crises diversas, sem vislumbre imediato de luz no final dos túneis e sem disponibilidade para efetivos pactos sociais mais abrangentes.

Bobbio ainda tenta sintetizar o quadro político, nos permitindo quimeras esperançosas: "Um Estado Democrático (decisões coletivas, debate livre, votações, direitos de associações e greve, manifestações pacíficas, reconhecimento de liberdade de expressão e de uma imprensa livre e responsável pela ordem social, preservação dos direitos civis, reconhecimento de normas legais de acordo com os "Direitos Humanos Sociais e Políticos dos Cidadãos"...só ocorreria se "todos" os "Estados contemporâneos constituídos" fossem republicanos, formando uma "comunidade democrática", que não colocasse em risco a ordem social liberal, que garantisse os direitos e ordem democrática liberal-burguesa."

A questão que fica, e também me inquieta, é:  " Como conseguir isso numa sociedade pluralista e policêntrica como a contemporânea, já que só pode haver uma convivência pacífica entre maioria e minoria, através da constituição, primeiro de uma 'sociedade civil' depois de uma 'comunidade política' que a garanta através do 'contrato', valendo-se do monopólio da força se necessário, como Bobbio é categórico ao afirmar, para que os pactos sociais democráticos sejam cumpridos ética e legalmente ?"

Gostei desse texto de Marcelo Lira Silva, intitulado " A Identidade Neokantiana de Norberto Bobbio: A Ética Moral da Paz e da Guerra Liberal-Democrata", datado de 2008!
 (www.marilia.unesp.br/aurora)

Agora é refletir sobre essas ideias para assimilar o que esses pensadores buscam transmitir, e até "ousar articular com o momento atual" que estamos vivendo, por que não?

Aurora Gite

P.S.: Vou atrás das "entrevistas de Zigmunt Bauman, divulgadas pelo Canal Youtube". Tenho certeza que o ouvi comentar sobre a "formação de um Poder Supranacional", até tomando como base a nova linguagem globalizada.  Não deixa de ser a pontuação de uma "possibilidade de combater o estado de anomia dos Estados-nação da pós-modernidade"!

Achei a entrevista: "La critica como llamado al cambio"!
Vale assistir em http://www.youtube.com/watch?v=X4YGdqgCWd8
ou http://www.youtube.com/watch?v=X4YGdqgCWd8&feature=youtu.be

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Psicologia Descomplicada

Nos dias de hoje, acredito ser importante se aprofundar um pouco mais em abordagens terapêuticas alternativas que buscam descomplicar o cuidar do ser humano, que busca maior equilíbrio interno na conquista de um bem estar, com maior amplitude no mundo considerado pós-moderno.

De pronto indico uma visita ao blog que tem por nome "psicologiadescomplicada": http://psicologiadescomplicada.blogspot.com.br/2011/03/caricias-e-emocoes.html

A meu ver, uma das perspectivas psicodinâmicas a serem conhecidas, tem por foco o método da Análise Transacional (Eric Berne, 1958)

Confiram se não faculta maior entendimento e abordagem compreensiva mais abrangente e descomplicadora, para auxiliar qualquer ser humano a romper barreiras que dificultem sua vontade de mudar.

Penso que não há como negar a necessidade de se motivar como indivíduo empreendedor, próativo e autodidata, a encarar a necessidade de se aventurar a um processo de mudar, quando muito se não é para apaziguar conflitos internos angustiantes, importante para acompanhar mais serenamente as aceleradas transformações dos dias atuais. O impacto do "novo mundo", particularmente nesse período de transição que estamos vivendo nesse momento, pode remeter o ser humano, não tão bem centrado em si mesmo, perdido e desbussolado - como bem diz Jorge Forbes e outros - a profundas depressões e a graves drogadicções.

Análise Transicional (A.T.) é um estudo psicodinâmico. Berne foca em sua análise, principalmente os estados de ego, as transações, a posição existencial e o roteiro de vida dos indivíduos. Para ele, oser humano tem necessidade de "carícias", unidade básica de sobrevivência psíquica, como tem de alimento para a sobrevida física. "Carícias são estímulos sociais dirigidos de um ser vivo a outro".

A.T.estuda e analisa a troca de estímulos e respostas em "transações" entre indivíduos em suas "fomes" (carências) e interesses (motivações).

Berne sofreu influência das ideias de Claude Steiner, autor de "Os Papéis que Vivemos na Vida" e do conto "Uma História de Amor" que computo como instrumento excelente a ser usado em dinâmicas de grupo com foco em integração humana e solidariedade, inclusive em organizações estudantis ou empresariais. Em seu conto, Steiner, com sabedoria e ternura, clarifica suas ideias sobre carícias e aborda o uso que fazemos de nossos "sacos de carinhos quentes". Destaca que "aceitar carícias negativas é como beber água poluída".

Ambos propõem a importância de se ampliar a percepção dos "jogos de poder interpessoal e dos scripts de vida"; da "alfabetização emocional", que vem a ser "um aprender a sentir". E não é o que mais precisamos nos dias de hoje ao resgatar o humano dentro de cada um de nós?

Não vale a pena conhecer como escolhemos nossos "scripts de vida"? A lembrança de como se deu dentro de nós a opção para sermos como somos, não nos ajuda a entender porque nos é tão difícil mudar?

Convém enfatizar que Steiner "discutiu sua teoria pela primeira vez em seu livro 'Games Alcoholics Play', onde abrangeu um único papel que é o dos alcoólatras". No livro "Papéis que Vivemos na Vida" amplia a discussão sobre os "papéis de vida trágica"... "como e por que pessoas que vivem de acordo com esse papel terminam seus dias e, ainda, como diagnosticar esses papéis". O autor vai mais além ao discutir os "papéis de vida banais"...como são escritos por nós, como são vividos por nós, indivíduos sem amor, com redução da capacidade de prazer e sem realizações gratificantes na vida.

Steiner não se limita só a "analisar e discutir uma abordagem terapêutica para os três papéis banais básicos: Depressão, Loucura e Falta de Alegria". Passa a explicar também "como as pessoas podem se libertar de seus papéis e viverem uma vida livre e autônoma", ou seja, como o ser humano, que quer realmente mudar, pode se descomplicar internamente e se inserir, efetivamente, em seu processo de mudar.

Ao se aproximarem de suas ideias, pensem se não seria fascinante já ir articulando-as com as emoções impactantes provocadas pela aceitação e incorporações das novas regras de convivência pessoal e social!

Acredito que já seria um grande passo para devidas assimilações mais harmônicas dentro de nós, e para que o processo de adaptação a esse mundo novo (previsível por Nostradamus?) ocorra de forma mais serena.

Não é fácil aprender a conviver com a incerteza e com a insegurança, com a busca de sossego e de firmeza no trilhar ante o eco contínuo, constante, em gradação sonante sempre em volume crescente : "Mudar...mudar...mudar...mudar..." , que mobiliza o locomoção humana a partir do milênio: "Mudar...mudar...mudar...mudar..." .Não tem mais volta, e não se consegue fazer calar dentro de nós!

domingo, 2 de novembro de 2014

"Divergente", o filme!

Acabei de assistir ao filme "Divergente" (lançamento 2014). Acredito que vá caracterizar a nova época que vivemos, onde passam a imperar visões ecléticas, que agregam várias perspectivas e diversos pontos de vista; ações mais ponderadas e inteligentes, com preservação da autonomia e liberdade; uma amplitude irrestrita da inteligência, e com isso, a prontidão do encontro de soluções para quaisquer problemas - desistência e medo de desafios serão considerados fraqueza humana, em contraponto com superação e audácia nas tentativas de ultrapassá-los.

"Divergente" vale a pena ser visto. Produz profundas reflexões em um vasto campo de perspectivas. Retrata um mundo onde as pessoas são divididas em facções, buscando um viver coletivo com mais harmonia... mas... vejam o que ocorre, e para onde o enredo nos encaminha!

A escolha pessoal de pertencer a uma determinada facção é irreversível. Por si só já exclui a possibilidade de, ante a vontade de desistir de pertencer a esse grupo, ser incluído em alguma outra facção. Sendo assim a pessoa passa à categoria dos banidos, diferentes rejeitados, não pertencentes a nenhuma facção socialmente aceita.

Critérios seletivos e ordens para avaliação, quando de treinos desenvolvimentistas, podem ser alterados a bel prazer imediatista e imprevisível dos líderes. Quem ousar quebrar o poder supremo, sofre severas penalidades, pagando até com a própria vida. Não há autonomia e liberdade para sair ileso de contestações tidas como rebeldias, e muito menos de questionamentos, buscando justificações, tidos como afronta à liderança vigente.

No mundo dividido em distintas facções, os valores diferenciais para uns, tais como honestidade, amizade, generosidade, coragem, audácia... se tornam fonte de ódios, invejas, manipulações destruidoras até ataques mortais, para outros.

Em meio às facções surgem os "divergentes", com capacitações superiores, difíceis de serem superadas pelos colegas e, por isso, motivo de grande ameaça aos representantes dessas ordens inquestionáveis, previamente constituídas.

Os "divergentes" só querem espaço para ser quem são. Não se encontram ao pertencer só à facção da "abnegação", ou só na da "erudição", o mesmo se dando só na da "audácia"..."Só quero saber e ser quem eu sou, e só quero poder ser eu mesmo quando for descobrindo isso por mim!" "Tenho em mim um pouco do tudo!". Realmente a angústia e a solidão de ser um divergente são enormes, e isso é bem expresso no filme.

A meu ver, essa é a luta a ser travada no milênio. O diretor bem encaminhou a sequência das cenas do filme, tendo êxito nos recortes que mostram a fuga dos enquadramentos sociais e a busca pelo espaço singular do ser humano em sua unicidade.

Nesse "filme de ação, ficção científica e suspense norte americano", ele não se furta de representar a plenitude amorosa no encontro de pessoas, que se reconhecem com suas raras características de superação, se descobrem mesmo ante as tentativas de camuflar sua integridade e seus medos, visando suas sobrevivências em meio ao coletivo massificador predeterminado. Nesse espaço dado ao humano, demasiadamente humano, contrastando com o mundo árido de afetos não padronizados, também são destacados os efeitos das tentativas do uso irracional e abusivo do poder sobre a raça humana, controle parcial e total de sua vontade e sua inteligência.

E lá me pus eu a refletir e a divagar sobre as reações provocadas dentro de mim ao assistir a esse filme.

Não será talvez, o "Divergente", mais um alerta contra a mídia e o jogo de vigilância em um "público que está sendo adestrado" a confundir o mundo virtual com o mundo real; "treinado" a se tornar incapaz de usar sua inteligência para reconhecer em sua razão um poder transformador; "condicionado" para evitar ser um agente social mobilizador de mudanças, resposta que não ocorreria ante a percepção do aliciamento e submissão existencial a poderes abstratos, corruptores da liberdade e autonomia, direitos a serem preservados por méritos pessoais de cada indivíduo, em quaisquer grupos a que pertençam?

Não trará esse filme mais uma mensagem de S.O.S. contra o excesso de deturpação da proteção aconchegante, mais uma cortina para esconder a ocultação da invasão de privacidade em um "público que está sendo acostumado a conviver, cotidiana e naturalmente", com a ilusão de uma participação concreta na vida artificial montada nos reality shows e sites interativos?

Não buscará, o "Divergente", ativar a coragem para combater os medos, conquistar a consciência do potencial humano em cada ser vivente e se imbuir de audácia, para correr riscos e quebrar a cegueira humana advinda do século passado?

Não procurará esse filme mostrar a "falsidade do pensar que" o encontro consigo mesmo - com a pessoa que realmente se é, em meio a medos e fracassos, autorrealizações e sucessos - está atrelado ao pertencimento a "numeroso grupo de amigos": "anônimos desconhecidos idealizados em elos fictícios" como sinceros e eternos?

Não tentará clarificar o esquecimento de si mesmo e a repercussão desse abandono no mundo interno do  homem que adentrou o milênio, para que se torne consciente do processo de involução, em que foi lançado, ao cair nas armadilhas que encobrem:
- seu "real contato distante e por vezes mascarado com anônimos", assim mantidos para bem representar a ficção vivida no "palco da redes sociais";
- seu "envolvimento transitório, superficial e passageiro, com os outros atores, facilmente modificado por um aceitar ou deletar, por vezes impulsivos"; -
- sua  "falta de demanda de um desejo e ausência de preocupação com afetos profundos", com estabelecimento de vínculos leais e fiéis a um "ser humano especial", raro patamar alcançado por poucos que possibilitam que um outro se torne mais significativo e compartilhe de sua intimidade;
- sua "tediosa acomodação", que esconde o fato de que o autêntico afeto entre humanos vem sendo amordaçado e sobrepujado pelo grau de "espetacularização nos sites interativos", a nível da tensão mobilizada através de mensagens ocas e vazias, ou mesmo das imagens disformes, maquiadas habilmente para impressionar grandes platéias;
- o papel dos cenários montados para impressionar e deslumbrar os incautos que, por não pensar por si, se deixam levar por esses conteúdos artificiais?
Quantos têm presente o contato com a verdade dentro de si e com o que ocorre ao seu redor; e quantos buscam com ela interagir, descobrindo seu autêntico lugar nesse mundo real?

Associo "Divergente" a outros filmes de ficção, que já pontuavam muitas das transformações que a sociedade vive hoje e pode viver amanhã. Cito "Minority Report", "O Pagamento", "Inteligência Artificial" (A.I.), Blade Runner... entre outros.

Na vida real, cada vez mais, cérebros e órgãos passam a ser monitorados após a implantação de chips; iris dos olhos são escaneadas e dados coletados são cadastrados; aceleradamente se amplia o uso da biometria; recursos da técnica de visualização virtual facilitam distorcer e alterar as lembranças da memória...Observamos a criação de andróides humanos, e a robotização do homem, a despersonalização afetiva do humano com sua aproximação da banalização do mal e da cruel violência consentida.

Há tempo alerto para os perigos  - que os filmes mencionados acima já avisam -  do corpo humano estar passando a substituir um "token", ante identificações eletrônicas e introdução de chips. Chips em veículos facilitam localização em caso de roubo, sequestro, fuga indevida. Pode resultar num bom recurso em intercorrências policiais. "Sorria, você está sendo filmado": sensores e tecnologias monitorando o "espaçopúblicourbano" podem indicar mais do que vigilância preventiva, pode representar uma forma de controle social. E está formada a confusão entre controle, monitoramento e vigilância informais. E se o cadastramento cair em mãos erradas de pessoas de má fé inescrupulosas?

É interessante observar o diálogo, nos regimes totalitários, entre as "sociedades de controle" (Deleuze) e as "disciplinar-repressoras" (Foucault). Vale a pena sobrepor esses filmes de ficção e muitas teorias do gênero, descritivas ou especulativas, e verificar suas aplicações na compreensão do que ocorre nas sociedades atuais, onde os valores humanos são tão vilipendiados e os direitos sociais tão violentados.

Por que tanto ódio da "divergente raça humana"? - É a pergunta que não quer calar dentro de mim".

Aurora Gite