sábado, 31 de março de 2012

Lembram de "Um Teste de 3 Minutos"?

Toda escolha de um teste deve abranger seu objetivo previamente definido, se adequar ao tempo que dispõe na dinâmica, tamanho do grupo, até o material necessário deve ser considerado. Ítens podem ser alterados para que se adaptem ao ambiente de trabalho ou ao tema em discussão.

Alguns pontos já devem ser previamente focados para posterior discussão grupal ou para serem considerados na avaliação a ser feita. No caso abaixo, tive interesse em saber:
1- quem seguiu as instruções revelando compreensão adequada da orientação passada
2- quem alterou as instruções desconsiderando meu direcionamento e o que o levou a isso
3- quem apenas escreveu o nome no canto superior direito da folha de papel e conseguiu controlar sua ansiedade se permitindo chegar até o final da leitura onde constava o que deveria ser executado
4- movimentação grupal ao deixar em aberto o que teriam achado de quem seguiu todas as instruções exceto a primeira ( que me daria indícios de sua contenção ou controle de sua ansiedade e de como a mesma interferiria em sua capacidade compreensiva)
5- quais questões teriam sofrido rasuras e respostas rabiscadas na folha, na medida em que as mesmas foram lidas.

Entre os objetivos do teste abaixo estão:
1-avaliar a habilidade dos participantes em seguir instruções escritas
2-desenvolver a comunicabilidade
3-conscientizar como ansiedades interferem na compreensão de um texto
4-trabalhar possíveis dificuldades no seguimento adequado de uma ordem dada
e por aí vai...
Acrescente outros de acordo com sua demanda no momento da avaliação.
Você deve ter em mente sempre:
Qual a finalidade desse teste, e não outro, para seu processo diagnóstico seletivo?
O que pretende medir ou observar ao aplicar um teste em particular?

Para o teste abaixo:
tempo necessário: 10 minutos
tamanho do grupo: ilimitado
material: uma cópia do Teste (instruções a serem seguidas) e uma caneta para cada participante

O procedimento consistiria de:
a) uma introdução sobre o tema comunicação, cuja clareza na escuta e fluência no sistema informativo organizacional, ainda representa grande ponto nodal nas empresas
b) informe ao grupo que ele será submetido a um teste de 3 minutos sobre esse tópico
c) comunique que o participante deve submeter-se às condições do teste
d) coloque uma caneta e uma cópia onde está impresso o "Teste de 3 Minutos", com o texto virado para baixo, à frente de cada participante.
e) informe-os que, ao se iniciar a contagem do tempo, terão exatamente 3 minutos para completar a avaliação
f) quando tiverem completado essa etapa, seria promovida uma discussão sobre transmitir e receber comunicados.

Obs: Deve-se perguntar se alguém já participou anteriormente desse teste. Mesmo que alguém já tenha participado, poderá participar novamente, lembrando-se e respeitando as condições do teste. Questiono um pouco tal fato, burilaria um pouco esse ítem, de acordo com a população a ser aplicado o teste. Nesse caso, cada aplicador que pense por si, sob o prisma de sua demanda e local empresarial. Aliás postulo que, em todo teste por mais padronizado e utilizável para grande número de pessoas, cabe a seu aplicador assumir a responsabilidade de especificar para si algumas nuances, conforme exposto acima. Por exemplo, eu talvez observasse outros aspectos nesse candidato, como sua postura em relação aos demais, sobre o uso que faria de um "poder", se sua atitude comportaria ironia, jocosidade em relação aos outros ou em relação a um líder, no caso o aplicador, idoneidade na preservação do sigilo sobre o procedimento...

Eis a folha que corresponde ao teste, que deve ser formatado com 3 espaços entre o título ( letra maiúscula, negrito e sublinhado) e o início das questões, e entre as mesmas (espaço 1 1/2 entre as questões para maior visibilidade na leitura). O importante é que tudo ocupe uma única folha, e só uma!

3' - VOCÊ TEM CAPACIDADE PARA SEGUIR INSTRUÇÕES?


1- Leia tudo antes de fazer qualquer coisa.

2- Escreva seu nome no canto superior direito desta folha de papel.

3- Faça um círculo em torno da palavra "nome" na sentença número 2.

4- Desenhe cinco quadradinhos no canto superior esquerdo desta folha de papel.

5- Fale seu nome em voz alta.

6- Escreva seu nome novamente, sobe o segundo título desta folha de papel.

7- Depois do primeiro círculo, escreva "Sim", "Sim", "Sim".

8- Desenhe um círculo em torno da sentença número 5.

9- Coloque um "X" no canto inferior esquerdo desta folha de papel.

10- Se estiver gostando deste teste fale "Sim"; se não estiver, fale "Não".

11- Ao chegar a este ponto do teste, fale em voz alta seu último sobrenome.

12- Na margem direita desta folha, multiplique 66 por 7.

13- Desenhe um retângulo em torno da palavra "papel" na sentença número 4.

14- Se achar que seguiu cuidadosamente as instruções até aqui, fale "Segui", para que todos ouçam.

15- Some na margem esquerda desta folha 69 com 98.

16- Conte com a voz em tom normal de 10 a 1.

17 - Levante-se, faça uma volta em torno de si mesmo e volte a se sentar.

18- Fale em voz alta: "Estou quase terminando. Segui as indicações."

19- Se você for o primeiro a chegar a este ponto, fale: "Sou o melhor em seguir instruções!"

20- Agora que você terminou sua leitura cuidadosa, conforme instruído no ítem 1, execute apenas o indicado na sentença número 2.


Obs: Esse teste não é de minha autoria e desconheço a mesma. Mas me foi muito útil ... do tipo mil e uma utilidades. Compartilho!

Aurora Gite





quinta-feira, 29 de março de 2012

Processo Seletivo : Candidata 2

Essa postagem complementa a postagem anterior, onde estão contidos detalhes sobre dados mais burocráticos.

Relatório confidencial

A candidata ... demonstra bons conhecimentos sobre a Instituição, sua missão, cultura e estrutura, bem como segurança ao abordar atividades práticas, referentes às funções de um ... . Seu interesse está mais voltado para a área de assistência, ensino e pesquisa. Reforça a dificuldade de conciliar o atendimento direto a pacientes, tendo que responder pela direção de um Serviço.

Apresenta muitas dúvidas e incertezas sobre como seria seu desempenho no cargo. Por duas vezes foi substituta do diretor em gestões anteriores e ante a exoneração destes, quando colocou seu cargo à disposição. Coloca sua preferência por cargos de vice, manifestando seu medo de assumir uma liderança, pois tem grande necessidade de aprovação das pessoas. Manifesta certo constrangimento no contato com "professores-doutores".

A candidata reconhece que perde algumas oportunidades profissionais, buscando justificativas que expliquem sua postura e suas "condutas de evitação", ante essas situações. Percebe que a ansiedade e o medo irracional predominam (sinais característicos nos transtornos fóbico-ansiosos), porém não possui recursos internos para lidar adequadamente com a angústia que acarretam.

Dados coletados sugerem ainda grande dificuldade em conseguir atuar sozinha para atingir suas metas, decorrente da oscilação entre o mundo irreal de ser capaz de tudo e seu reverso, sentir-se totalmente impotente. Ambiguidade e insegurança predominam, dificultando seu poder decisório e sua combatividade, particularmente em situações que envolvam terceiros. O receio de errar prejudicando ao outro, a culpa que aborda sentir, o medo da rejeição externa (reflexo da auto-rejeição), impedem a canalização adequada de sua energia em prol da realização ou de sua eventual manutenção (sem tanto conflito).

A candidata cita que, alguns anos depois de formada, foi convidada por alguns médicos para montar a parte de ... na Santa Casa de ... . Achou que podia fazer tudo sozinha. Os médicos é que a convenceram a delegar mais, procurar trazer mais profissionais para atuar com ela. Relutou, segundo suas colocações, mas posteriormente consentiu e verificou que tinham razão.

O quadro fóbico a mobiliza para atuar evitando situações, onde possa haver um confronto com suas limitações e impotência. Está consciente, inclusive, do sofrimento ocasionada por dúvidas posteriores sobre se não teria desempenhado a contento essas funções, se tivesse assumido mais o cargo. Reconhece que algum dia terá que enfrentá-las, o que pode ser decodificado por "se enfrentar".

Conclusão

A candidata demonstra grande interesse em evoluir profissionalmente e em contribuir para a organização do Serviço de ... Manifesta sua vontade de continuar como vice, "atuando nos bastidores". Coloca que "custa muito tomar decisões, fica com muito medo de errar", e que "para liderar é preciso pulso e firmeza". Reforça que foi "a primeira a indicar a candidata 1 para substituir o diretor demissionário".

Acredito que em equipe possa ser uma participante ativa e colaboradora, contribuindo muito para a integração e dinamismo grupal, principalmente sentindo-se amparada por uma liderança segura e incentivadora.

Aurora Gite

Obs: Não deixem de comparar com o perfil da candidata 1 e com os requisitos exigidos pelo cargo em questão.


Processo Seletivo: Candidata 1

Espero que o exemplo possa lhes ser útil. Vão perceber como planejo e o que abarco em minhas avaliações.

O pedido veio, por escrito, do Diretor Geral Executivo do Instituto ... , que faz parte de um grande Conjunto Hospitalar.
Foram me encaminhadas duas candidatas para o cargo de Diretora de Serviço... sendo que uma delas logo na entrevista, se coloca que não gostaria de exercer esse cargo de liderança.
Não estranhem, mas durante o processo seletivo, fui procurada por uma antiga médica do setor, que após colocar sua proximidade com Prof. Dr. ..., Diretor Geral da Área Clínica..., refere que teve a incumbência por parte da Diretora demissionária (que ocupava o cargo em aberto) de transmitir a preferência da mesma para que essa candidata (vou chamar de candidata 2) fosse preferida e ocupasse seu lugar.
Pode? Pode sim e isso é ainda mais comum do que se imagina.

Encaminho para vocês os dois relatórios, candidatas 1 e 2 .
Vou dividir em duas postagens: processo seletivo candidata 1 e processo seletivo candidata 2


Formatação mais burocrática onde constam: cabeçalho oficial, data, direcionamento (nome, função, local)

Ref: processo seletivo para o cargo de Diretor do Serviço de ...

Relatório confidencial

A candidata ... apresentou grande coerência em todas as etapas do processo seletivo (testes, dinâmica de grupo e entrevistas). Demonstra bons conhecimentos sobre a instituição, sua missão, cultura e estrutura, bem como segurança ao abordar atividades referentes ao Serviço de ... onde atua. Há algum tempo já realiza a divulgação do próprio Instituto ao desempenhar suas funções como mestranda, palestrista e congressista, o que coloca fazer "com orgulho".

Semelhante postura adota quanto a sua vida profissional e pessoal. Casada há 26 anos com um médico, com três filhos maiores, considera-se bem amparada por sua família. Refere buscar a integração familiar através de um bom diálogo embasado por diretrizes racionais, e adaptação dos horários para preservar atividades comuns. Coloca ter consciência da necessidade de algumas modificações se assumir efetivamente o cargo, que poderão afetar um pouco essa dinâmica familiar, mas acredita encontrar soluções alternativas. Afirma ter ponderado bastante sobre tal fato e conversado com familiares e colegas de trabalho, antes de tomar a decisão de assumi-lo sendo a escolhida.

Considera-se capaz, com coragem, determinação e espírito empreendedor, além de possuir noções administrativas, advindas de sua especialização em Administração Hospitalar. Passou por grandes dificuldades para ascender profissionalmente. Dados coletados sugerem ainda apresentar a candidata grande vontade de vencer, buscando transformar desafios em realizações concretas, forma inclusive de compensar seu quadro de ansiedade antecipatória. Está consciente sobre a necessidade de administrar seu lado ansioso, e o faz buscando planejar antecipadamente suas ações, concretizando algumas, para se prevenir e reduzir variáveis ambientais descompensatórias.

Considera-se responsável pelo que faz, citando situações onde pernoitou realizando relatórios e protocolos, buscando o cumprimento de metas e planejando mudanças, visando reverter o quadro de uma organização caótica do serviço, que lhe coube administrar. Segundo ela, sua perseverança, algumas vezes beirando a teimosia, a fez cair e se levantar em seguida, disposta a enfrentar os obstáculos e buscar soluções para os problemas, obtendo resultados satisfatórios.

Autodidata em inglês, conseguiu ter seu projeto de mestrado aprovado, recebendo convite para desenvolvê-lo em outro setor desse Hospital ... .Teve frustrada sua primeira tentativa rumo ao mestrado, pelo afastamento do "professor doutor" responsável pela orientação do projeto. Infelizmente, ante novas diretrizes políticas, não pode prossegui-lo. Numa segunda tentativa, apareceram novas dificuldades para realizá-lo. A perda foi sofrida, pois, considerado de grande amplitude, lhe possibilitaria conseguir a titulação de doutora. Na ocasião foi-lhe vetada a oportunidade legal de contar com os próprios pacientes desse Instituto. Outra frustração, porém investiu novamente. Fez novo projeto e obteve nova qualificação. Deve terminar seu mestrado em ..., tendo adiantado boa parte de suas coletas para futuro doutorado, o que confirma algumas características citadas, reforçando sua capacidade de planejamento e organização.

Já atua, como diretora interina, dentro de um modelo participativo de gestão. Tem boa capacidade para negociar. Pode-se inferir que apresenta condições de boa contenção de suas angústias, o que lhe possibilita uma disponibilidade, receptividade e acolhimento ao outro. Desempenha o papel de facilitadora do diálogo entre, e com, os membros da equipe. Reconhece sua tendência de superproteção, procurando se manter vigilante nesse sentido.

Está ciente de seu papel recente na mobilização de maior união e participação espontânea dos membros da equipe de ... , adotando uma postura real e humilde. Reforça para todos que no cargo não se realiza nada sozinho, sendo importante a colaboração grupal para um bom andamento do serviço e boa qualidade de atendimento. Tem buscado a valorização pessoal de cada um dos ... e funcionários que trabalham no setor, buscando incentivar trabalhos bem feitos. Procura o resgate do orgulho da categoria e que a mesma se empenhe em apresentar trabalhos inclusive para a preservação do espaço físico dentro do Instituto. Suas ações se baseiam na consolidação do espírito de equipe.

Os dados colhidos sugerem uma liderança firme e justa, alicerçada por uma moral elevada. Assim atua também com sua família. Reconhece que a mãe exercia papel semelhante em sua família de origem. Cita a importância do aprendizado obtido, que a fez elaborar as injustiças profissionais sofridas e as humilhações por que passou. No confronto consigo mesmo, continua com seu respeito próprio.

Apresenta dados sugestivos de grande respeito à hierarquia institucional, onde "se o diretor falou, como duvidar de suas colocações, até que as ações provem o contrário" . Demonstra seguimento a normas e regras institucionais, se permitindo questionar aquelas comprovadamente disfuncionais. Acredita que alterações adaptativas são conseguidas se houver boa integração entre os funcionários e diretrizes racionais visando um bem comum.

Tem boa visão do todo, rapidez de raciocínio, capacidade de síntese e previsão, o que lhe permite firmeza e facilidade nas escolhas e tomadas de decisões, o que lhe possibilita se posicionar a frente dos demais. Procura, no entanto, delegar funções, a quem perceba ter condições de assumir responsabilidades, caso contrário, centraliza em si a iniciativa de honrar compromissos. Confia que um bom exemplo possa se transformar em incentivo para o outro. Tem confirmado isso na vida prática.

Submissão e aceitação sem possibilidade de contra-argumentar, posturas autoritárias e desrespeitosas, ante esse tipo de liderança ética inata, equivalem a uma violentação à própria dignidade da condição de ser humano. Seu quadro ansioso a impede, nessas circunstâncias, de se aprofundar em maiores questionamentos, que envolvam angústias vitais. Procura manter determinado distanciamento nesses relacionamentos, segundo suas próprias colocações. Adquire assim condições de se estabilizar emocionalmente. O equilíbrio dessas descompensações reside no cultivo de sentimentos mais elevados e dignos, permanecendo leal a seus valores internos, o que denota amadurecimento psíquico.

Demonstra sensibilidade ao abordar a imagem distorcida que passa às pessoas, que não a conhecem como realmente é. Reconhece que isso é algo a ser trabalhado e parece que está conseguindo com a equipe de ..., nesse momento.

Conclusão

Pelo exposto, e considerando o perfil de um líder centrado em um modelo de gestão participativa, acredito ser esta uma candidata em potencial.



Vamos à próxima postagem: candidata 2?
Então me acompanhem, ok?
Aurora Gite


quarta-feira, 28 de março de 2012

Compartilho : Dinâmica de Grupo - I

Dinâmica de Grupo é uma técnica muito utilizada ao se buscar maior integração e melhor cooperação grupal ante uma tarefa comum, bem como em processos seletivos para obter melhor compreensão da adequação do profissional, avaliado num mundo artificial permeado por interações reais, onde se pode inferir características de personalidade.

Técnica usada por profissionais de diversas áreas, torna-se distinta por seu foco específico, pela leitura efetuada dos resultados das observações obtidas, análise e avaliação das consequentes informações cruzadas. Como técnica é vaga, dependendo portanto dos recursos que embasam seu foco, escolhido ante objetivos pré-determinados. Sendo assim, torna-se imprescindível na seleção de estratégias e instrumentos, a clareza da meta a ser atingida, para que o procedimento se mostre adequado à situação e se obtenha eficácia em seus resultados.

Um grupo possui uma estrutura básica de interações, o que possibilita uma leitura e compreensão da dinâmica tanto a nível individual quanto da vida de relação que o permeia. Tal fato possibilita um melhor administrar recursos para diminuir duas ansiedades predominantes, que poderiam desintegrar o grupo: o medo ao ataque e à perda de equilíbrio, decorrentes das cobranças e fiscalizações excessivas entre seus elementos.

O entendimento da dinâmica do grupo também fornece os meios para melhor motivar o envolvimento de seus elementos, propiciando gratificações pessoais e uma responsabilidade compartilhada, indispensáveis para se obter uma boa adesão grupal. Uma participação mais cooperativa do que passiva é obtida ao se dinamizar o querer, responsável pelo compromisso ou adesão interna de cada um. O não envolvimento é observado sob várias forma de resistência à mudança, expressas não só a nível de rebeldias e contestações, mas ante indiferenças, atitudes não cooperativas e posturas e alianças visando a cisão da união grupal, negativas e depreciativas, inclusive com ataques aos vínculos com a equipe ou com os colegas.

Vida em grupo sempre implica em renunciar a interesses pessoais em prol do grupo, em fazer concessões e conviver com frustrações constantes, tolerando o desprazer da não obtenção imediata de satisfações individuais. O grupo que passa a ocupar o lugar do elemento central, se configurando como equipe.

Na interação grupal, não é fácil a contenção de impulsos, ante a vontade de se expressar verbalmente, o ceder espaço e ouvir o colega, respeitando suas posições mesmo diferentes da própria. O saber o momento adequado para escutar o outro e só depois expressar o que sente do que ouviu demanda amadurecimento emocional e aplicação de inteligência emocional, termo mais difundido atualmente. para articular a extensão dessas colocações, evitando comunicações com ruído dissonante. Conservar o próprio silêncio gera desconforto e angústia necessitando gerenciamento e disciplina para manter o controle dos mesmos. Ao coordenador da dinâmica de grupo cabe a habilidade e a firmeza nas intervenções, visando propiciar que todas essas forças atuem dentro de certos limites, evitando a desagregação e fuga de seus elementos. Para exemplificar, imaginem possíveis reações ante alguém ocupando o papel de monopolizador dentro do grupo, não permitindo espaço para os demais se colocarem, ou desqualificando ironicamente o que é colocado pelo outro. Pensem na dificuldade de conseguir integração e inclusão nesse ambiente caótico, onde a configuração de um time não se delineia a contento.

A troca de experiências propicia uma amplitude de percepção (insight), que se estende ao grupo como um todo. O ato de perceber significa o início de um processo de elaboração interna, daí podendo advir motivação para enfrentamento, manejo e solução integradora de conflitos ou sofrimentos, portanto, melhor qualidade interativa grupal e maior produtividade no uso das idéias inovadoras que emergem.

A meta atual não é mais buscar transmitir informações, nem sua aplicação prática seja na empresa ou na vida. Não envolve mais, só o conhecer e saber fazer, nem o querer mobilizando esse processo. Envolve o comprometimento pessoal com o que faz, buscando a excelência interna na expressão do próprio potencial, a garra de evoluir abrindo espaço e o ser reconhecido pelos próprios méritos.

Essa mudança de atitude reverte na necessidade de estratégias dinâmicas voltadas a uma inclusão ética, postura interacional transparente e justa, valorização pessoal independente dos cargos ou papéis sociais ocupados, e avaliação interna de merecimentos justa pelo reconhecimento de que pontos fracos poderão ser transformados em pontes fortes, por quem o quiser.

Aurora Gite

Obs: Valem se inteirar dos estudos de Bion sobre as alianças pessoais, ou tipos de interações, que ocorrem na vida em grupo. Suas teorias sobre a vida grupal e suas análises das qualidades das interações são fascinantes. Acredito que consiga pelo Google.

Lembro muito de uma aluna que transmitiu o ensinamento de seu pai, médico radiologista: "É preciso conhecer bem o que se procura para poder encontrar uma resposta diagnóstica que ... ". Acredito que isso vale para tudo na vida, pois como achar sem saber sobre o que procurar?


segunda-feira, 26 de março de 2012

Por acaso, mas não tão por acaso assim!

Não é possível deixar de vivenciar a sincronicidade nos acontecimentos, tão enfatizada por Jung, em cada momento de nossa existência e nas coisas mais banais, cujas relações poderiam passar despercebidas. Vou até mudar a forma de me expressar!

Ante nossa desatenção, ou desinteresse, de estabelecer as conexões entre o que nos ocorre em nosso dia a dia, deixaríamos de entrar em contato com o fascinante mundo das sincronias e sintonias de energias e respectivas vibrações. São elas que nos dão as frequências dissonantes ou afins, no que se refere ao campo energético que nos envolve, e que proporcionam o "clima", ou a "química" se preferirem, que faz com que nos afastemos ou nos aproximemos do que nos cerca - aqui incluindo "pessoas".

Por acaso, mas não tão por acaso assim, após ter acabado de formatar uma contraproposta para a venda de minha residência, resolvi dar uma caminhada pelo bairro, remoendo minha obrigatória desistência do local que contêm tantos encontros e desencontros. A civilização chegou!... gritava minha razão tentando me convencer da hora exata para a transação. Olha pra cima, mais um pouco e não se vai mais conseguir observar a beleza do azul do céu e a dança das nuvens, em seu caleidoscópio de abstrações! ... sussurava meu coração. Observe em frente, veja a cortina dos prédios sendo construídos ao redor, impossibilitando a bonita e direta visão noturna da ponte Água Estaiada, toda iluminada!... se uniam razão e coração buscando me dar alento.

Envolta em todas essas divagações, deparei numa banca de jornais primeiro com a Coleção Guias da Filosofia, série Filosofia Especial, "Nietzsche, um pensador combativo", volume IV ; e, logo ao lado, em oferta duas revistas no mesmo pacote, Revista Língua, Psicanálise & Linguagem, referentes aos anos 2008 e 2009, mas com conteúdo atemporal.

Voltei para casa, carregando nos braços possíveis idéias que poderiam me auxiliar em minha pesquisa, buscando confirmar minha hipótese de que Freud fora o pioneiro na documentação do movimento da energia quântica (o "outro" que nos habita e fala por nós e conosco sem que possamos nos dar conta, exceção a situações de inspiração artística ou outras semelhantes via intuição) .

Por outro lado, observando as capas, podia me inocular com a coragem e força do pensador combativo, cujas conhecidas obras e idéias admirava, e me com "O Inconsciente é uma Linguagem: como a psicanálise criou uma forma de interpretar a palavra para ajudar o homem a enfrentar o mundo e a descobrir a si mesmo... como entender o ato falho... o acesso à mente pela literatura". Ops! Parte de minha proposta era "um adeus", um olhar de sofrido abandono e necessário desapego, um choro interno doído que possibilitaria o caminhar rumo ao novo e desconhecido, que se tornaria prazeroso dependendo de minha postura referente a ele, sem expectativas embasadas em comparações com o que deixava para trás.

Vou tornar concreto e exemplificar o que digo. Abro para vocês a porta de minha casa querem ver? E com uma simples relação de móveis, pode isso? Me acompanhem e no final reparem como me despedi de cada detalhe e ... Mas vamos ao segundo ítem da contraproposta a que me refiro, buscando justificar minhas demandas contratuais:

" Começo por me situar encaminhando a relação de alguns de meus móveis:

***entrada:
1- espelho alto de família por volta de 2m de altura com suporte de mármore e estatuetas de bronze
2- pedestal de bronze e devida estátua clássica por volta de 1.70m de altura
3- duas cadeiras "tipo diretor"

***Hall após entrada:
1- arca "estilo art nouveau" de 1.80m aproximadamente com 8 gavetões com ferragens
2- duas cadeiras de espaldar alto - veludo riscado - cor laranja

*** no canto de estudo, pesquisa em notes, espaço para montagem de quebracabeças
1- mesa com circunferência de 1.20m
2- 4 cadeiras com assento de palha

*** no mesmo patamar, separado por parede com design de concreto aparente,a sala de jantar
1- mesa de 2.50m de madeira com detalhes em aço escovado
2- 10 cadeiras de espaldar alto = veludo verde riscado
3- buffet alto por volta de 3m de largura e 1.80 de altura
3- carrinho acompanhando o conjunto da sala
4- mais duas cadeiras avulsas no mesmo estilo

*** descendo alguns degraus, sala de estar de 9m por 6/7m dividida em 4 ambientes:
1- sofá de 5 lugares, 2 cadeiras sem braço e 2 cadeiras com braço no "estilo Luis XV", mesa quadrada ao centro
2- conjunto de sofá de 4 lugares e 2 poltronas (1m x 1m), mesas laterais e mesa do centro - madeira com design em riscos esverdeados e tampo embutido de vidro (1.20m X1.20m)
3- espaço para leitura e som com conjunto com módulos de 2 lugares e de 1, duas bergeres de espaldar alto com acabamento tradicional em tachinhas, mesa... e na bancada de concreto na extensão de 6m com aparelhos de som garrafas de bebidas, etc
4- mesa de jogos com 4 cadeiras "estilo medalhão" encosto e assento de palinha
5- bar (1.20m)
6- tapete persa original de 7m por 5m aproximadamente (acomodando ítem 2)

*** do patamar da sala de jantar, subindo alguns degraus, o mezanino onde está a sala de tv:
1- sofá de 4 lugares
2- mesa lateral redonda
3- 6 módulos sem braços
4- 2 cadeiras de balanço encosto baixo, madeira e revestimentos de palhinha
5- estante em módulos com Te de 52 polegadas
6- esteira elétrica oficial com monitor digital da Athletic

*** do mezanino subindo 7 a 8 degraus largos hall de leitura com 2 poltroninhas de junco nao início do corredor de distribuição dos 4 quartos, closet e banheiros

Obs:
1-um dos quartos transformado em academia com:
a) bicicleta ergométrica
b) cadeira multifuncional AB Stretch, com barras e pesos para pernas e braços, flexibilidade para alongamento e abdominais e bicicleta na posição sentada ou inclinada
c) aparelho oficial elíptico da Athletic para pedalar em pé e trabalhar braços

2-outro transformado em escritório com:
a) escrivaninha de vidro para PC multifuncional e tv 10"
b) sofá de 2 lugares
c) estantes para livros (ponto forte da casa) que vão desde a coleção original dos volumes da "Encyclopedia Britannica" e várias outras coleções.

3-quarto do casal:
a) cama com 4 gavetões (2m/tamanho extra size)
b) dois criado mudo
c) estante modular com tv de 42"
d) poltrona reclinável "tipo do papai"

4-quarto que seria destinado a hóspedes

Pelo relatado, haveria necessidade de parte ser deixada em ... "


E por aí vai... e por aí vão vidas reais, desmontadas com o passar dos anos e as limitações e desgastes que não perdoam, com seus encontros gratificantes, seus desencontros martirizantes... sua abertura para o novo, seu enterrar "defuntos de sonhos"...um contar só consigo mesmo para suportar o peso das vivências com seus erros e acertos... um se soltar para a vida e enfrentar o medo do ser livre... e um buscar o bem-estar interno que vem do se apoiar na dignidade da subjetividade construída e mantida constante ao longo do tempo.

Mais do que aparência, "status" e dinheiro no bolso, é daí que vem a força para dar adeus ao que um dia deu realmente sentido à vida, naquele momento. Agora é "tornar-se presente" em seu existir, direcionando o significado de escolhas e decisões, visando a qualidade do aqui e agora, a excelência da atuação pessoal no próprio viver.

E "vamo que vamo" que a vida não nos espera!


Aurora Gite



















quinta-feira, 8 de março de 2012

O tédio: perda temporária do sujeito desejante

Considero o tédio a perda temporária do sujeito desejante que é quem envolve nosso ser psíquico no interesse por buscas prazerosas, visando algo que preenche uma falta, e o alcance de autorrealizações que nos satisfaçam e dêem sentido à nossa vida.

A dor psíquica da angústia do tédio, para muitos, vem num crescente. Por ser uma angústia livre de objeto é de difícil controle. A Gestalt com suas fantasias nos permite tomar consciência dessa dinâmica interna, possibilita contato com os sofrimentos psíquicos, sem afastá-los ou deles fugir camuflando a dor psíquica, ou ainda negar a sua existência numa brincadeira de "faz de conta que não é comigo que está ocorrendo".

Algumas pessoas, que tiveram uma infância convivendo com interações mais aconchegantes e respeitosas, estruturantes de uma personalidade mais autocentrada, constituíram uma maneira de ser mais saudável. Puderam defender e ocupar seus espaços como sujeitos desejantes, sem terem sido colocadas no lugar de realizadores do desejo do outro. para que ele se sentisse mais aliviado ou mais "feliz", afirmação que constitui um ledo engano.

Como se comunicar por conceitos pode se constituir em fonte de confusão, torna-se importante diferenciar a personalidade autocentrada que se constitui em centro de autorrefêrencia para o ser psíquico mais amadurecido, da maneira de ser autocentralizadora da condição de sujeito na postura narcísica. O narcisista se destaca por se coloca como centro de referência de perfeição e acertos, a ser reverenciado por outras pessoas, que devem girar ao redor de seu desejo e opiniões, de sua vaidade e orgulho. Arrogantes e desrespeitosos, não se apercebem do valor das diferenças humanas na pequenez do cenário onde observam unicamente sua imagem grandiosa refletida.

Nossa sociedade ainda cultiva um pensar voltado à razão concreta e padronizada, e incentiva uma disciplina pessoal mais rígida e criteriosa voltada a ordem e passividade da massa social. Empreendedorismo, criatividade, inovação, são muito estimulados desde que mantenham o "status quo" de quem usufrue de privilégios. Nessa categoria incluo os pais e familiares educadores.

Não causa pois espanto, a constatação de como tem se alastrado a sensação tediosa, o desinteresse necrosante do imaginário sonhador.

Impera o sentir-se perdido se tiver que usar o raciocínio abstrato, a imaginação e a criatividade, para permitir a eclosão do tesão de um desejo por um objeto, que permita nomear a falta causadora da angústia. Predomina a impotência e sentir-se enfraquecido por ter que suportar a enorme pressão da energia psíquica em processo de combustão pela antevisão alucinatória de um sonho ou do provável ganho prazeroso. Como conviver com o fracasso e a frustração, e voltar a estimular a vontade, em sua força enfraquecida, para voltar a expressar a singularidade de um desejo, enfatizando que ele é sempre pessoal e intransferível?

Desejo representa uma falta. E essa falta é única para cada ser humano. Não há educador que consiga fazer prevalecer na economia psíquica um mercado baseado em trocas de desejos: ofertas, advindas unicamente do mundo exterior, nunca vão conseguir suprir a prioridade de uma demanda pessoal. A via da frustração não aceita devoluções gratuitas. E toda reposição tem um preço psíquico. O importante é buscar o equilíbrio entre custos e benefícios posteriores.

Uma criança, ou um adulto imaturo emocionalmente, não tem condição de cruzar esses dados e processá-los mais harmoniosamente. A situação mais fácil é se colocar na dependência dos "cuidadores do pensar e melhor direcionar o desejo alheio". Ah, não tem condições de avaliar que a conta vai para o balancete econômico da energia psíquica do suposto "sujeito desejante"!

Pensem nisso ao calar a boca de uma criança que tenta expressar o que quer, ou o que tem vontade de ter. Querer não implica que se vá ter. Mas a preservação dessa capacidade é estruturante para a construção de uma personalidade forte e autocentrada, dona de si e boa gerenciadora de seus desejos. No administrar seu querer, como sujeito desejante, a criança vai ter que lidar a "satisfação de ter o que almeja", ou conviver com a "frustração do não ter o que quer" e tolerar o desconforto de continuar com a falta, postergar a obtenção desse prazer ou substituí-lo, se for importante para conseguir um estado interno de bem-estar. Esses são os passos para se conseguir o crescimento emocional.

A educação atual exibe uma dupla fachada, por um lado a de estar voltada para a formação ética de uma criança feliz, livre e empreendedora, e por outro a de ocultar a ação de mantê-la como humano robotizado e impotente dentro dessa sociedade amoral e violenta. Os curriculos institucionais e as interações familiares ainda buscam, em suas essências, adaptar as crianças aos "padrões sociais do certo e errado", "do seja bonzinho (ou boazinha) para ser aceito (a) e amado (a)".

Mais ainda e isso me preocupa muito, de maneira perversa, até pela não tomada de consciência sobre tal mecanismo repressor, por meio do qual incutem a culpa na criança, indefesa - pela fragilidade de seu aparelho psíquico operacionalizar sua angústia - em sua função de preservar a integração de seu mundo interno do maciço bombardeio desetruturante proveniente do mundo externo que a cerca, se houver , qualquer tentativa que seja, de se manifestar como pessoa que pensa e sente diferente dos educadores.

Esses exercem suas funções de cuidadores de forma ambivalente, ou seja, protetora e ameaçadora (gosto de você se...) . "Sorridentes castigam por amor", com rejeição, isolamento e constante ameaça de retirada de afeto, as crianças que ousam uma atitude reacional, considerada como confronto pessoal rebelde, contra as regras de condutas estipuladas por um social insalubre, sob o prisma da saúde mental.

O que mais me penaliza é observar como tantas crianças tentam ainda lutar por seu existir singular e por expressar sua autenticidade como indivíduos, sem serem "escutadas" nesse grito de socorro, visando a soberania de seu mundo psicológico.

O tédio pela vida é, a meu ver, um dos indícios angustiantes desse auto-abandono. Por mais que se tenha conquistado determinada autosuficiência, ele vai ser o preço dos anos de dependência psíquica com outras pessoas pensando pela criança, escolhendo o que é melhor para ela, desejando por ela, ou - o que é pior - estendendo seu desejo ao mundo psíquico dessa criança que passa a ter grandes dificuldades futuras até em dar sentido à sua vida, à sua liberdade.

Seus momentos felizes são, na maioria da vezes, sempre permeados pelo medo de perdas e até de ganhos. São assolados pelo medo do tédio no amar, pois sem ousar inovar para combater a mesmice e o desinteresse claudicante nas relações cotidianas e aprender a tolerar e conviver pacificamente com a instabilidade imprevisível da interação consigo mesmo, como se sentir seguro para a entrega amorosa?

Qualquer desvio é sentido como desintegrador. É preferível conservar-se sob rédeas curtas. assim é fácil, mantendo a disciplina, se organizar internamente, e não sentir a angústia que explode se tomar consciência do movimento de forças que mobilizam a energia em seu mundo interno.

Nosso psíquico se mantém vivo graças às colisões de oportunidades e possibilidades, de decisões incertas e contínuos processos de escolhas. Sendo assim, a educação desse milênio, não pode se voltar mais para modelagens de maneiras de ser, enclausuramento de potencialidades empreendedoras e inovadoras em quartos escuros mentais, cárcere privado do ser psíquico, que pode se tornar prisão perpétua conforme as circunstâncias da vida.

Muitos adultos vão ter que se resgatar e abrir seu espaço, mesmo com tanta defasagem pela formação insegura ante o desafeto que vivenciaram; vão ter que aprender a lidar com seus medos e receios de correr riscos; vão ter que enfrentar suas fobias sociais e angústias de exposição e críticas. O desafeto é como se fosse um veneno psíquico que contamina direto o senso crítico, já que a autocrítica rebaixada assim enraizada por anos é também distorcida no adulto que se defronta com a impossibilidade de buscar comprovações de autorrealizações com base na realidade, postura necessária para o fortalecimento da autoestima, valorização e alcance da maturidade emocional.

Para melhor propiciar a tomada de consciência de si mesmo, o contato com seu sentir e a coragem de se posicionar perante a vida, por mais marcas que possa trazer da infância, indico os experimentos de crescimento em gestalt-terapia contidos no livro "Tornar-se presente" de John O. Stevens, da Summus Editorial.

"Baseados em Gestalt-Terapia, e originalmente criados como parte da formação clínica de estudantes de psicologia, estes experimentos percorrem as principais áreas de funcionamento da personalidade em contato consigo mesma, com os outros, com o meio ambiente e com a corporeidade."

Transcrevo uma das vivências desse livro para ser experienciada como exemplo da ação desse instrumento. Através dele posso trabalhar o tédio, o desapego ao velho já conhecido e o se aventurar ao interesse pelo novo. É o encontro com o sujeito desejante que irá destronar a angústia do tédio.

Muitos preferem acionar as imagens em sua tela mental com os olhos fechados. Em algumas outras fantasias, existe essa necessidade para melhor focalização interna.
Direcione a história bem lentamente, dando tempo para que a imagem seja criada e observada detalhadamente, bem como o ouvinte (ou você mesmo) possa seguir o que ocorre em seu sentir nesse momento, tornando-se realmente presente em sua fantasia.
Na dinâmica, as imagens se movimentam por si, e muitas vezes, os cenários, que são montados mentalmente, surpreendem mesmo. Percebam o esforço que dispendem e tentem compreender o que significa em termos de resistência. O autêntico não demanda esforço para se expressar, faz parte de nossa psique em liberdade.

O livro de Stevens traz várias fantasias que podem ser adaptadas conforme o interesse pessoal e o foco das angústias ou do crescimento interno que se quer tomar consciência para melhor mobilizar a vontade de se transformar: desmontar velhas maneiras de ser e erigir novas formas de se posicionar perante a vida.

Ante o sofrimento pelo tédio, que tal se aventurar a caminhar comigo rumo à loja abandonada, depois à loja de trocas, para em seguida tornar-se você mesmo sem o tédio, e aprendendo a lidar futuramente com ele, quando se aproximar outra vez ( porque isso vai ocorrer, se fizer parte da formação estrutural de sua personalidade) ?

No caso dessa fantasia, o próprio autor escreve:
"Uma fantasia como esta, com uma cidade, é particularmente boa se se estiver num lugar onde haja ruídos de tráfego, etc. Estes ruídos perturbariam ou se introduziriam em algumas fantasias, mas a esta apenas acrescentarão algo, uma vez que são apropriados a uma cidade, e tornar-se-ão parte da experiência da fantasia, sem perturbá-la." (p.203)


Loja Abandonada e Loja de Trocas (p.202)


"Quero que você imagine que está andando pela cidade, à noite, na chuva. Você está bem agasalhado, e pode ver as luzes da cidade refletidas nas ruas molhadas. ... Ande por algum tempo e explore a sua cidade. ... O que você vê?... Como é a sua cidade?... O que acontece nela?... Como se sente ao andar nesta cidade?...

Logo adiante há uma ruela deserta. Caminhe por esta ruela e logo verá uma velha loja abandonada. ... A vitrine da frente está suja e salpicada pela chuva, mas olhando de perto você verá umas formas opacas atrás dela. ... O que foi abandonado nesta vitrina?... Chegue mais perto e tente ver o que há ali. ... Esfregue um pouco o vidro, de forma que possa ver mais claramente. ... Examine esta coisa mais de perto. ... Como é ela? ... Observe todos os detalhes. ...

Agora torne-se esta coisa abandonada dentro da loja. Como é a sua existência sendo este objeto abandonado? ... Poe que foi largado ali? ... E como se sente? ... Entre mais na experiência de ser esta coisa abandonada. ...

Agora torne-se você mesmo e olhe cuidadosamente a coisa abandonada na vitrina. ...Você observa algo que não tinha observado antes? ... Lentamente diga adeus a esta vitrina e ao que se encontra nela, e continue a andar pelas ruas da cidade. ... Continue explorando a sua cidade por algum tempo. ...

Mais adiante há outra ruela estranha. Ao caminhar por ela, você vê uma vitrina com uma variedade incrível de coisas: coisas novas, velhas, e muito antigas. Algumas não valem nada, outras são tesouros, e você nunca esperaria encontrar todas elas na mesma vitrina. ... Enquanto está parado aí fora, olhando as coisas da vitrina, um velhinho sai e o convida a entrar. Ele diz que esta não é uma loja comum. Dentro desta loja, aparentemente pequena, existe tudo que há no mundo. Qualquer um que encontre o caminho da loja, pode escolher algo e levar consigo. Você só pode levar uma coisa. Não pode pegar dinheiro e nem vender aquilo que pegar. Fora isso, você pode pegar qualquer coisa da loja. Demore algum tempo para olhar a loja e ver o que há nela. Há todos os tipos de cantinhos e quartos laterais, cheios de coisas que você gostaria de ter. ... Eventualmente você terá que decidir qual destas muitas coisas você quer levar consigo. ...

Quando você tiver decidido o que levar, dedique algum tempo para conhecer melhor esta coisa. ... Olhe para ela cuidadosamente e observe todos os seus detalhes. ... Toque-a com as mãos. ... manuseie, cheire. ... Como se sente em relação a esta coisa? ...

Quando você está saindo com a coisa escolhida, o lojista fala de novo com você e diz: "Você pode ficar com isto, como lhe disse antes. Existe apenas uma condição: você precisa me dar algo em troca. Pode ser qualquer coisa que tiver, e você não precisa estar com ela agora, mas tem que me dar algo em troca daquilo que pegou". O que você dará ao velho?... Demore algum tempo para se decidir. .. Agora diga ao velho o que dará a ele. ...

Saia pela porta e dê uma última olhada para a cidade. ... Lentamente diga adeus a ela. ... Agora volte a esta sala e traga consigo aquilo que decidiu pegar na loja. ...

Agora torne-se esta coisa que você encontrou na loja. ... Sendo esta coisa, como você é? ... Quais são as suas características? ... Como é a sua vida? ... O que se passa com você? ... Qual é a sua função ou sua utilidade? ... Tente entrar realmente nos detalhes da experiência de ser este objeto. ...

Agora torne-se você mesmo de novo e olhe mais uma vez para o objeto. ... Veja se consegue descobrir mais sobre ele. ... Você o compreende melhor agora? ... Vagarosamente diga adeus ao objeto e coloque-o em algum lugar da memória ... e agora descanse por algum tempo. ..."

No livro citado tem muitas outras fantasias.
Eis um treino válido: escolham o instrumento, conforme a necessidade observada em seus mundos internos, ou de seus pacientes.

Aurora Gite