quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Violência Social versus Cordialidade Perdida

Vale assistir, e até rever: GloboNews Painel (domingo, 16 de fevereiro de 2014) sobre a violência na sociedade brasileira. Pelo Google pesquisando  globonewspainel/violência/16-fevereiro conseguem assistir.

Há tempo uma inquietação constante, ao analisar a dinâmica dos movimentos sociais, me conduzia a refletir sobre o mundo de "anomia"  e de "impunidade" em que vivemos, e indagar sobre quando estaremos seguros para exercemos nossa livre expressão, direito que deveria ser zelado, legalmente, pela Justiça.

É inquestionável que enquanto imperarem "impunidade" e "distorções éticas", organizações paralelas continuarão a mandar e a violentar nossa "dignidade como ser humano" e nosso "direito a respeito e paz", mesmo dentro de um social tão agressivo.

O Poder Executivo adentrou na esfera do Legislativo e do Judiciário, que, por sua vez, se perderam na elaboração e aplicação de leis que, obsoletas e canalizadas para atender a interesses pessoais ou corporativos, não respondem às demandas do novo milênio, ou se mostram insensíveis aos apelos da nova sociedade emergente.

E, lá me permitia eu, me perder no labirinto de tantas informações e evidências do grande caos social, e tentar buscar caminhos alternativos que levassem a mudanças desse complexo quadro sociopolítico. Lá ía eu, articulando dados, analisando e comparando situações semelhantes para evitar erros crassos, procurando vislumbrar parcimoniosamente possíveis novas soluções legais, de acordo com nossa época, a serem implantadas passo a passo, gradativamente. Lá me punha eu buscando saídas que, com bom senso e firmeza administrativa levassem nossa sociedade ao respeito a uma nova ordem aplicada a uma hierarquia reconhecida, no que se refere a cada um dos âmbitos dos "três poderes montesquieuanos".

Não há como não partir dos três poderes distintos - Legislativo, Executivo e Judiciário - que caracterizam o Estado de Direito dos regimes democráticos, cujos limites perderam seus contornos delineadores, a meu ver, na sociedade brasileira; com isso, o povo perdeu seu referencial para se manifestar em protestos legais, e ser escutado em suas queixas e pontuações de falhas das instituições legalizadas, e o Governo Estatal se outorgou um lugar de justiceiro egocentrado na elaboração de leis que melhor convenham à sua meta messiânica de centralizar as tomadas de decisões e a responsabilidade pela boa gestão do país.

E eu, continuava a me indagar sobre como "resgatar a voz dos cidadãos", silenciada-amordaçada-subjugada pelo temor de represálias sociais e individuais, e "inserí-los como agentes participativos", sem que levem bordoadas de policiais, de um lado, ou  sejam ameaçados pelos representantes do crime organizado, por outro lado.

Carregava uma certeza, tendo em vista a divulgação e comprovação de tantas operações governamentais mescladas de indecentes propostas autoritárias, ou melhor dizendo totalitárias, articuladas na calada da noite e por baixo do pano, que oculta a real transparência das perversas intenções políticas, que, a meu ver, o governo que aí está, exercendo seu poder em nome da nação brasileira, não representa o país Brasil, do qual me orgulho de pertencer.

E lá estavam no programa acima juristas, cientistas políticos, historiadores... como nos anteriores já estiveram antropólogos, sociólogos, filósofos, psicólogos... buscando uma compreensão mais ampla sobre o que acontece no momento atual calcado em uma agressividade desumana, o que impulsiona as circunstâncias sociais para desqualificarem de tal forma o sentido do humano e desvalorizarem o poder das leis, o que determinou, na maioria das pessoas, a falência mortal da esperança em um mundo melhor a ser vivido com mais qualidade de vida.

É questão institucional, faltam mecanismos de participação e espaço para livre expressão social!
A violência é uma forma de defesa social, ante o quadro da falta de punição e abuso da força versus complacência e ausência da cordialidade no convívio entre as pessoas. Advém da incapacidade das corporações legalizadas, e do próprio Governo instituído, de darem conta do grau de insatisfação popular. A crise atual se agrava  pela dificuldade das estratégias visando a colocação de limites. Tudo se misturou: os que deveriam defender e zelar pela segurança pública, agridem e matam; os que deveriam cuidar do patrimônio cultural e social, que ajudaram a construir, inclusive pagando pesados impostos, o destroem.

A questão é econômica, além das relações entre o social e os interesses do coletivo, envolve o indivíduo e suas pulsões, seus impulsos inatos! Envolve o mercado de consumo e o aumento de expectativas, caindo nas percepções marxistas da dificuldade de conter as frustrações coletivas com as grandes discriminações injustas de classes sociais: de um lado privilégios concedidos em excesso, de outro a categoria dos explorados como mão de obra produtiva, sem outro espaço social para serem reconhecidos; subjugados com rigidez dentro das humilhantes prisões burocráticas e da implacável aplicação de leis elaboradas conforme os interesses de classes dominantes, oligarquias ainda existentes.

Ops! A questão é da esfera política, da tomada de decisões e administração da coisa pública. Vivemos uma crise de lideranças políticas, ainda mais com a visão transparente que situação e oposição estão devendo à sociedade brasileira. O problema é que o novo já nasce velho, pois setores arcáicos permanecem no interior do governo, eleição após eleição. Observem o império de tantos anos de famílias "sarneynianas", em suas oligarquias e defesas corporativas envolvendo os interesses familiares. Portanto, o problema está nos privilégios às organizações e ao espírito corporativo versus o cumprimento da missão pública, ou seja, a desconsideração da demanda pública. E a quem, como cidadão, além de fazer parte do povo, quer ter consolidado seu papel ativo na inclusão e participação nos processos decisórios que envolvem a nação brasileira, a revolta é o grito do socorro: saída da posição impotente e vulnerável, do ser incapaz com seu julgamento crítico sempre desacreditado.

Opa, espera aí! A questão não está só nas mãos da aplicação das leis. Convém lembrar que o império da lei é o centro da Democracia, defendendo as igualdades sociais, o respeito às diferenças e aos direitos, a observância dos limites impostos pelos deveres visando convivências pacíficas. O problema maior é o descrédito da palavra empenhada nas negociações, a inexistência de pactos de honra como antigamente.O que fazer agora que as leis não têm mais valor, que perderam sua função de abrigo protetor? Tudo ficou à deriva, nesse sentido, com a petrificação do sistema, com instituições que não funcionam mais, com as frustrações sociais vindas intempestivamente à tona, canalizando a vontade política das sociedades vigentes.

Epa! Aparelho jurídico institucional não funciona? Sistema político não é capaz de capturar líderes ou de formar lideranças? A elite política está fracassada? Então o problema envolve a "cultura política". A cultura política é violenta, reformas sociais são estratégias planejadas e elaboradas, guardando enorme distância da vivência concreta das pessoas. Erro tudo se basear em ideologias utópicas distantes da realidade do povo. Toda judicialização observada, nesse momento social, decorre da fragilidade política. O Supremo Tribunal Federal arca com atribuições em excessos, que necessariamente não são de sua alçada julgar, pois existem outras instâncias judiciais para tal.

E eu continuava a me perguntar como é que foi colocado de lado, ou esquecido, que, na dinâmica entre pessoas que se percebem como iguais, portanto, que podem exercer papel ativo na luta por seus direitos e deveres, não cabe mais a aceitação da submissão. Daí a reação brasileira desproporcional se manifestar dentro da perspectiva de respostas cada vez mais agressivas, desumanas e perversas. Por que tanta demora em perceber, concretamente, o que abrange uma real negociação diplomática do verdadeiro político?

Como não recordar as ideias de Hannah Arendt, em seu livro A Promessa da Política (p.146): "A suposição de que há no homem algo de político que pertence à sua essência, não acontece. O homem é apolítico (Não há substância política - Hobbes)... A política surge 'entre os homens', portanto, absolutamente fora dos homens."

Vale unir esses dados, com as ideias contidas em "A República", de Platão!
Chega-se mais facilmente à compreensão da "Justiça" e "Convivência Cordial" entre os homens.

O diálogo tem que ser reinstituído. A sociedade tem que amadurecer emocionalmente, e vai fazê-lo mas a duras penas, da forma como tem traçado sua vida de relação. A forma de agressão física e violentação da integridade psíquica tem que ser substituída pelo esgrima das ideias e dos argumentos, evidenciados por fatos concretos e necessidades observadas, que demandam saneamento imediato.

A Democracia tem que crescer como sistema político na sociedade amadurecida, ou tende a fenecer. Quem grita por socorro, nesse momento, é ela!


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