terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Vivências terapêuticas

Eis que, de repente - "de onde" é o que pesquiso - surgem, em alguns pacientes, lembranças... recordações tão vívidas que o transcorrer dos anos - e ponham-se anos nisso, 40 anos talvez! - não conseguiram ensombrecer, muito menos apagar.

E eu, os ouvindo, me punha a indagar sobre qual seria o amálgama que estabelecia e mantinha alguns vínculos afetivos. Entendo "afetivos" tendo por referência algo que afeta internamente as pessoas, e a consequente forma como as pessoas, envolvidas pelo caleidoscópio dessas energias psíquicas misturadas, se permitem serem "afetadas".

Desde pequena minhas inquietações se voltavam ao que havia surgido primeiro na mente: as idéias ou os pensamentos e o que era que mobilizava a vontade, as intenções e as efetivas ações das pessoas.

O mundo psíquico já me era fascinante, não como algo estático mas dinâmico em seu jogo de forças bioenergéticas!

Nos últimos anos me aproximei dos conceitos quânticos e a leitura compreensiva que me foi facultada através da Física Quântica me jogaram mais profundamente nesse campo "além do espaço e do tempo, onde encontra-se a fonte de possibilidades infinitas, verdade, inteligência e realidade" ("A Janela Visionária", Dr.Amit Goswami).

O tempo cronológico é determinado pelas noções de tempo/espaço instituídas até pela observação científica do mundo material, mas o que determina sua inexistência no mundo psíquico?

E lá me via eu mergulhada em reflexões sobre o psíquico inserido no bioeletromagnetismo, sobre o conceito de quanta e sobre a definição da matéria, também, como ondas de possibilidades:

* Quanta -"discreta quantidade de energia emitida por pulsos, e outros atributos da matéria como o momento/angular" (posso pensar em circunstancial?),
* átomos, em sua instabilidade, que "por excesso de energia acumulada, tendendo a liberá-la, ao decaírem emitem energia sob a forma de radiações" ,
* átomos que ao livrarem-se do excesso de energia tornam-se, assim, estáveis.

Eis o mundo da mudanças contínuas, das ações e reações, sequenciais e previsíveis, campo das técnicas comportamentais e cognitivas, com as estratégias terapêuticas visando melhor adequação de respostas ou reações disfuncionais a estímulos definidos, ou o desmontar crenças - idéias irracionais enraizadas não questionadas - substituindo-as por operações realísticas racionais ... e por aí vão as intervenções, sobre os momentos vividos no presente, para que pacientes adquiram instrumentos para melhor administrar suas vivências...

Mas e a questão das probabilidades/possibilidades?
Quem, ou o quê, provoca o "colapso da onda de possibilidade no elétron real, no espaço e tempo reais, num caso real de observação"?

E lá vinha Gotswami: "Sempre que observamos um objeto, nós vemos um ato único, e não um espectro inteiro de possibilidades e probabilidades... A observação consciente é condição suficiente para o colapso da onda de possibilidade... O agente que transforma a possibilidade em ato é a consciência...A consciência é quem cria a realidade - o propósito criador - porque a escolha se converte em ato... E a escolha do ato, a partir das possibilidades compreende a mudança descontínua."

Como não associar ao mundo do inconsciente freudiano e ao jogo da consciência, que permeia essas operações psíquicas?
Existem princípios inteligentes atuando nesse mundo latente, fora da realidade material tempo/espaço - pertencentes a outra dimensão atemporal e espacial, próprias, a meu ver, do mundo das ondas de possibilidades quânticas, que conservam sentidos a serem decifrados e tornados manifestos.

Nesse sentido, cabe aos terapeutas o contato sensível com a qualidade das energias vibracionais, que mesclam os elos afetivos, particularmente as que envolvem o vínculo paciente-analista em seu setting de projeções, tranferências e contra-transferências, ampliados para cliente-psicoterapeutas ou para profundos e significativos elos pessoais, contatos que podem se transformar em experiências emocionais corretivas.

Como afastar Krishnamurti nesse momento?
Para ele, o homem vive no tempo psicológico, apegado a suas experiências egóicas, conflituosas.
* "O próprio processo de pensar envolve o especular, examinar e evidenciar... Utiliza-se da memória, da experiência e do conhecimento, que, por sua vez, estão atrelados ao passado e aos condicionamentos."
* A base de tudo é energia... A mente opera sem o tempo...O tempo psicológico, sob esse prisma, não existe...Mas todo movimento do conhecimento envolve o tempo. O conhecimento é baseado no conhecido (passado) e é projetado para o vir-a-ser (futuro)..."
* Físicamente, ocorre o aumento da capacidade do cérebro... O tempo está inserido no desenvolvimento do cérebro. O cérebro pertence ao tempo, mas a mente não pertence ao tempo. Agora, estará todo o cérebro condicionado pela estrutura temporal? Pode o cérebro, dominado pelo tempo, não subordinar-se a ele?

E continua Krishnamurti, nos provocando, com suas indagações:
Como limpar a mente do acúmulo do tempo?
Como viver sem conflito? Como viver sem pressão?
Como se desapegar do "eu", mundo das palavras e significados, e se aproximar da essência do "mim" , mundo silencioso, que não tem a ordem do tempo e o sentido prisional das palavras?

Para Krishnamurti, existe algo "além do vazio".
"A vida é algo captado além do vazio, no sentido da mente ir além das teorias... O silêncio faz parte do vazio... a vida faz parte do vazio, mas é diferente dele... A 'sensação do nada' indica que a separação, criada pelo ego, pelo tempo, pelo pensamento, pela educação - terminou. O 'nada' passa a ser o 'tudo'. E o tudo é a energia total, não diluída, pura, não corrompida, que emerge de uma base interna."

E eu, novamente, me ponho a perguntar sobre a máxima freudiana da "necessidade de tornar consciente o inconsciente".
E lá vem Krishamurti: "Só há verbo atuar no presente ativo, não no tempo passado ou futuro... No olhar não verbalmente (traduzido e fixado em palavras) mas atentamente, há um estado de atenção sem esforço...É um outro itinerário interno. A comunicação interpessoal torna-se uma comunhão..."

Quando se diz eu compreendo, quem é que compreende dentro de nós, a não ser o que chamam de ego? Há uma entidade interna, no momento da compreensão, que nos diz isso. Ocorre mais separação e não aproximação empática. Na comunhão ocorre a apreensão do outro, uma intuição empática, pois é neutralizado o observador fora da relação. O observador, como diz Krishnamurti, e qualquer um pode experienciar, é a coisa observada. Há uma comunhão de energias. outra qualidade de comunicação, onde a compreensão vem do 'sentir', como ocorre na compreensão da natureza do amor."

"A vida é um movimento de relações (ondas de possibilidades?) ...As relações são a base da existência...A confusão começa quando o fato real se torna memória... Essa memória é que exige continuidade do prazer, repetição das coisas... gerando expectativas e medos... projeções voltadas para o autopreenchimento já que existe a identificação com algo próprio projetado no outro..."

Para Krishnamurti, o sentimento de vazio interior indica o quanto nossa mente é superficial: olha a si própria e se sente vazia, mobilizando um impulso para preenchê-la (sequência de desejos para preencher faltas criadas pelo ego, necessidades inventadas pelo "eu").

Lá se questiona ele: Por que existe esse vazio, instituído oficialmente, dentro de nós?

E assim nos responde, realçando o perigo e o necessário cuidado com as palavras:
"Essa 'vacuidade' decorre da palavra (e quem a institui, como ao pensamento, é o "eu") - em seu sentido comparativo... Ante a necessidade de comparar, eu me engrandeço ou me diminuo... quando a ação se torna um esforço de imitação, de ajustamento, de seguir um padrão de prazer, acarreta agonia... só conhecemos a ação nascida da ideia... E a ação em si é diferente da ideia advinda do pensar... decorre da ação do "mim": é criativa, intuitiva, original, espontânea, virtuosa ..."

Como novamente não parear algumas dessas informações com as técnicas psicanalíticas, particularmente aquelas direcionadas à postura do analista?

Lembram da "atenção flutuante"? Investiguem o que acontece dentro de vocês, como terapeutas.
Não seria um aquietar pensamentos e um adotar a postura do observador descrita acima por Goswami e Krishnamurti?

Não equivaleria a um "permitir a interconexão de uma energia psíquica livre do analista/observador, com o analisando no lugar do observado, facilitando a 'atitude de comunhão' e a ponte para insights"? Não se estabeleceria "um livre fluxo de sentido entre as pessoas na comunicação" (físico David Bohm), nessa comunicação sem que a mente esteja concentrada em focos específicos de atenção, pré-selecionados por pré-julgamentos sobre atitudes do analisando, ou mesmo por expectativas ansiógenas do analista, até sobre acertos de suas intervenções ?

E, que tal, se agregarmos Bion?
Lembram de sua famosa frase: "O analista deve estar na sessão sem desejo e sem memória".

Nesse ponto de minhas reflexões, indico uma visita ao site da Escola Paulista de Psicanálise, de onde retiro as frases citadas abaixo, de um texto de Ale Esclapes:
(http://tecnicaapsicanalise.wordpress.com/tag/bion)

"Toda vez que uma pessoa nos fala livremente de seu passado, está falando inevitavelmente de seu desejo presente. Ela fala algo muito mais do que simplesmente lembranças. Fala do que gostaria de ter tido, do que gostaria de ser, do uso que essas lembranças podem servir no presente. Mas nunca, jamais, uma lembrança, uma memória, é ingênua. Ela é sempre a presentificação do desejo... Armadilha: muitas pessoas acreditam que o passado têm vida própria, que não podem escapar de suas lembranças, quando na verdade não conseguem escapar de seus desejos. Nesse caso o amo (o Eu) se rendeu ao seu escravo (o desejo) que passa a comandá-lo. Não é mais o cachorro que abana o rabo, mas o rabo que abana o cachorro. Ou como disse Nietzsche - 'O passado atormenta o homem'."

"Em que deveria residir a interpretação do analista? Em sua atenção? Em sua memória? Bion toma uma atitude radical em relação ao tema: a interpretação deve residir sobre a notação (armazenamento perceptivo de informações) e não sobre a atenção (movimento interno que consiste em um ato intencional que visa utilizar o aparelho de percepção a fim de buscar algo) ou sobre a memória. Inclui-se na memória toda a teoria que o analista dispõe sobre psicanálise, sendo que esta deve acontecer a cada sessão. Uma determinada teoria serve para explicar um determinado caso, uma determinada sessão, mas depois deve ser esquecida. Qualquer interpretação que contenha elementos teóricos, uma construção, está contaminada com os desejos e memória do analista."

Não resisto ainda a citar, também da análise de Ale Esclapes, essas considerações sobre a obra de Bion:
"A interpretação deve estar baseada no que 'nota' (notação) no enquadre...A questão da ética bioniana é um dos aspectos mais difíceis de sua técnica, uma vez que o analista precisa mais do que nunca estar focado no aqui e agora, imediato e mediato que ocorre entre analista e analisando, pois somente isso pode servir como elementos para notação. Exige-se uma presença do analista ao mesmo tempo que todo seu aparelho perceptual, incluindo-se aqui sua intuição, devem estar abertos para serem impressionados pelo analisando. Uma interpretação que não seja baseado nisso, não tem para Bion, valor terapêutico."

E eu, nesse momento, continuo, com firmeza e perseverança, a especular sobre os dados que possam validar minha hipótese de que "Freud foi o primeiro a observar e intervir sobre a energia quântica presente em todo ser humano".

E vocês terapeutas?
Procurem articular os dados expostos, com o perfil de comunicação do milênio, visando interações mais humanas e contatos menos robotizados.
Observem como muda a visão do terapeuta e como, tudo isso, interfere na escolha de técnicas psicoterapêuticas, muitas vezes, dificultando a obtenção de maior eficiência e eficácia nos resultados, pelo 'excessivo pensar sobre' e 'selecionar com rigidez condutas' a serem seguidas durante as sessões, obstacularizando boas intenções e competências profissionais.

Aurora Gite





Um comentário:

Unknown disse...

Excelente o seu blogue
Dei por ele no www.anhglobal.org
Vejo que a obra de Krisnamurti esta sempre presente quando nos queremos mudar de padrão.
Vou segui-lo
Abraços
Isabel Sousa