sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

A armadilha e o perigo


Sabe onde residem a armadilha e o perigo?

O perigo é deixar que a relação a dois, e a familiar, se intoxique pela falta de respeito entre as pessoas... aí a convivência fica insuportável ,,, até o amor pode acabar.
O amor é uma força que impulsiona os que amam à busca de crescimento interno e conquista de dignidade pessoal.
Sendo assim não é tão difícil de distinguir, mas é muito difícil de ocorrer!
É preciso muito amadurecimento emocional para ter essa disponibilidade interna ao respeito pelas diferenças e estar receptivo ao outro como ele é.

A armadilha é querer que o outro seja o que ele não é; não pode ser mesmo que tente!
Se quiser mudar o outro para que se aproxime de seus ideais, não o ama. Se projeta nele um perfil, que construiu mentalmente, o que sente não é amor.
Vai perceber quando sentir amor, e focar em uma pessoa especial, que desperte essa vontade de fazer o melhor de si e sentir prazer pelo outro fazer o mesmo.
Quando para sustentar a relação tem que fazer concessões, que violentam sua maneira de ser e seus valores mais íntimos, não há relação amorosa que resista.
Isso vale para todos os níveis: amizades, amor filial e fraternal, quando muito o amor conjugal!

Resgato algumas ideias de Espinosa, como as que colocam a vida como "constantes devires em produção", campo abstrato para o "encontro de corpos" ou de forças. Para ele pessoas, pensamentos, ou os homens, como se refere, se constituem em forças, vindas de dentro deles e de fora. Essas forças podem se constituir em pressões impostas , os remetendo,  pela presença do constrangimento, a uma servidão atroz. Não existe liberdade se, no encontro de forças, não ocorre a produção de vida a partir delas, para inovar ou ter o poder de "produzir outra maneira de existir no mundo das relações, mantendo, se ainda vivo, o elo amoroso entre os envolvidos".

Segundo esse pensador, no ser livre, efetuam-se forças que vêm de dentro de si; ao acoplá-las ao seu "viver em liberdade", expressa sua natureza e aumenta sua potência. Portanto, cabe a cada um entender sua natureza (essência) e promover encontros afetivos que o possibilite manifestar e aumentar seu singular potencial.

Parcerias, quaisquer que sejam, deveriam ser um espaço para que ocorresse um agregar de forças no encontro amoroso, e não seu desgaste por exigências e cobranças de padrões de conduta do outro que se encaixem às próprias expectativas e idealizações de como deveria ser a interação, para obter mais prazer de acordo com interesses meramente unipessoais. Qualquer forma de anulação do outro na interação, controle sobre o parceiro e restrição a sua maneira espontânea de ser, seja por ciúme, jogo de poder, humilhação ou subjugação castradora por insegurança e sensação de inferioridade próprias, ferem direto à liberdade do outro, e se tornam um tiro certeiro ao coração da relação afetiva.

Observo no fenômeno amoroso uma "força dinâmica" ( em movimento, não estática); o amor mais como um meio que impulsiona, quem o sente, a evoluir e buscar uma integridade ética, uma dignidade pessoal, autorrealização que o valorize e do qual se orgulhe. Sendo assim, amor é força dinâmica, motor propulsor, causa ativa que impulsiona o crescimento interno de quem ama, tomando como referência seu centro interior de valores éticos, e não os que lhe são impostos por normas morais sociais.

A energia amorosa não é remédio, não serve como prescrição para que seja alcançado equilíbrio emocional; não é vínculo vital pelo estabelecimento da dependência fissural com esse alguém especial, como o fazem os drogadictos.

Quem não se disse: "Putz, que barra!" quando, por vezes, o mundo parece desabar sobre sua cabeça, sem vislumbres de alternativas de fuga de situações paralisantes?
Quem não sentiu sua criança interna, impotente e frustrada (com raiva), gritar por aconchego: "Eu não merecia isso!"
O que fazer, a não ser que cada um amadureça e concentre suas forças - não em queixas e autorrecriminações culposas, mas na montagem de uma cena mental (formatação de imagens mentais) acolhedora?

Por exemplo, por que não se utilizar da "técnica de imaginação ativa" e não pegar sua "sofrida e triste criança interna" no colo, sentar com ela em uma cadeira de balanço e, seguindo o ritmo do embalo suave e delicado, com a cabeça dela encostada em seu peito, fazer um terno cafuné nos cabelos dessa criança, tão viva e tão presente em você, embora você prefira não dar tanto valor a sua voz ativa, implicante e implacável na marcação de seu espaço dentro de você?

Cenas mentais bem montadas, sob a coordenação de um diretor eficiente - que percebe as necessidades reais do que ocorre com as emoções que permeiam as forças dentro do cenário que dirige - apaziguam o ambiente conflituoso psíquico, propiciando a confiança na vida e seus desígnios, com maior resignação e serenidade.

Por vezes, o elo de ligação, uma sincronização energética ou sincronicidade junguiana, ou encontro de forças similares espinosistas, com meninos de 72, não reside na afinidade de almas, no frescor da ternura e pureza ingênuas intuídas em suas crianças internas medrosas, em processo corajoso de melhor se conhecer intimamente e clarificar culpas indevidas? 
Ou melhor, por que não, se é o que falando de amor pode suscitar?

Aurora Gite

Para quem quiser se aprofundar nas ideias de Espinosa, indico os vídeos disponíveis - no Canal do YouTube: Claudio Ulpiano, filósofo espinosista (1932-1999), vídeos-aulas sobre esse pensador.

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