domingo, 4 de agosto de 2013

Aprovaram ou vetaram a "Cultura do Encontro"?

Em meio a tanta violência que se alastra em uma velocidade espantosa em nossa sociedade nesse início de século; em meio a tanta intimidação ao "humano que há no homem", com o predomínio. hoje em dia, da cultura do "Cada um por si, cuido do que é meu e o outro que se vire se quiser cuidar do que é seu, porque se precisar passar por cima dele para sobreviver não vou ter opção, piso e massacro mesmo até com uma pontinha de prazer. Faz parte da cultura do século!"; em meio ao visível embrutecimento dos corações dos homens - (leram a obra de Erich Fromm, em particular "O Coração do Homem: Seu Gênio para o Bem e para o Mal"?) - que se tornam cada vez mais máquinas insensíveis para sobreviverem atuantes nos cruéis sistemas sociais, incluindo as aberturas de espaço e permanência  no mercado de trabalho, eis que surge, em meio a tantos desencontros com o humano dentro de cada um de nós, uma nova e tentadora proposta: "Formação de uma cultura do encontro"!

A tomada de decisão é agora, não se tem muito mais tempo para pensar a respeito sobre possibilidade de alternativas para escolhas acertadas, o mundo deste século é o do encontro com a cultura das incertezas e inseguranças, da ansiedade com a liquidez do descartável que passou a englobar os amores líquidos, como bem analisa Zigmunt Bauman em seus livros. Como mais uma dica para ajudar nossa opção de aprovar ou vetar: vale conferir o vasto patrimônio literário desse autor.

A nossa opção atual envolve o aprovar internamente, arriscar e investir o capital humano, aderir a esse movimento social. Ou vetar a proposta logo de cara, desconsiderar e engavetar inspiradoras ideias inovadoras, em  prol da manutenção de um "status quo" social e da "robotização humanizante", sobre a qual a tecnologia digital e a criatividade humana investem aceleradas. A formatação dos encontros atuais e desencontros futuros entre os homens-robôs já tem seu design nas planilhas e nas mentes dos homens, poderosos em seus conhecimentos, que se voltaram para as diversas áreas manipuladoras da "engenharia humana".


E aqui voltamos ao ano de 2013, ano que ficou marcado pela visita do Papa Francisco ao Brasil.

Não há como negar que representou um indivíduo singelo em sua simplicidade e humildade, com suas estratégias de ações para unir mentes e corações pelo sagrado no coletivo. A meta de sua proposta "criação da cultura do encontro", da aproximação entre as pessoas por amor e generosidade, visa a construção de uma nova humanidade, através de alterações significativas e consistentes nas formas de convívio entre os homens. "Desce" o frio pensar racional entre indivíduo isolados, e "sobe" o calor radiante e contagiante do sentir um amor racional pela humanidade como um todo.

Acredito que a gestão desse pontífice vai marcar época não só na história do social, mas também dentro de cada um de nós. Retifico: já marcou época, haja visto o número de pessoas que conseguiu agregar a seu redor. Não se pode deixar de reconhecer que obteve êxito em sincronizar seu "acolher com o coração, escutar o outro com atenção, sintonizar sua intenção de Bem Coletivo", e em divulgar a força da generosidade nas trocas pessoais como fator de união amorosa.

A meu ver, o verdadeiro ato generoso é acolher com afeto um coração triste ferido, focar energia no entender com compaixão (com respeito tolerante e não com pena depreciativa) seu sussurro (SOS clamando por ajuda), recolher suas lágrimas tendo o propósito da inclusão em cada aproximação ou intervenção.

A visita do Papa ao coração dos homens propiciou o confronto da superficialidade do frio aparente - até a natureza enquadrou esse encontro no clima de inverno -  com o calor da riqueza e beleza das almas, que dele se aproximaram para se confortar com seu aconchego e amor.

Impactante para quem pode presenciar, a aceitação do silêncio proposto por ele, em meio a seu discurso, para que suas palavras pudessem ser acolhidas no coração e meditadas no encontro consigo mesmo, envolvendo todos aqueles jovens que o cercaram e as demais pessoas que se juntaram a essa Jornada da Juventude, e acolheram sua pessoa com tanto carinho e admiração.

Missão cumprida do Papa em sua meta de sensibilização de fiéis, evangelização e agregação de novos discípulos, união ao redor da Instituição Igreja Católica. Lindo espetáculo global de tantas pessoas reverenciando o papa, em meio ao barulho do mar e aos braços abertos da estátua do Cristo Redentor.

Missão cumprida da tecnologia informatizada e da inovação via Internet com pronta e instantânea divulgação globalizada. A ela se deve a congregação de vários países ao redor do Papa e do Brasil, país onde a Jornada da Juventude transcorreu nesse ano de 2013. Como não se sentir incluída na "família mundo", como não acolher a energia de fraternos desconhecidos em nossos corações de indivíduos únicos e singulares?

Como não sentir apreensão com o que iria ocorrer no amanhã? Como impedir que uma frase pairasse dentro das pessoas:"Amanhã é  outro dia... qual lembrança e quais imagens ou palavras desse Papa tão carismático, irradiando uma energia de amor e aproximação entre as pessoas tão contagiante, persistiriam, além do cansaço no corpo e falta de contato visual?

Acredito que o Papa Francisco, com suas sutis pontuações, vai mobilizar muitas reflexões, questionamentos e intervenções mais adequadas no que diz respeito aos cuidados com a saúde e boa qualidade de vida, com a queda da idolatria do dinheiro permeando as relações e trocas humanas, tornando mais racional e justa a distribuição de riquezas, e particularmente na educação, ou acesso ao conhecimento, buscando transformações efetivas visando o resgate do humano nas sociedades atuais tão desumanizadas.

Muito me sensibilizou sua preocupação com os extremos discriminados e excluídos. Com os jovens, responsáveis pelo futuro, que embora ávidos por reconhecimento e abertura de espaço no mercado de trabalho, são silenciados em sua criatividade inovadora e isolados profissionalmente, sem acolhimento após obterem seus diplomas. Com os idosos, que deveriam merecer respeito e admiração por carregarem o patrimônio da sabedoria acumulada na arca das vivências pessoais e experiências sociais, e no entanto foram amordaçados, desconsiderados e até ridicularizados pela intolerância às limitações que a idade impõe, não só a cada um deles, mas a todo ser vivente. Muitos se esquecem que o tempo passa rápido pelos humanos e logo espelha essa passagem pelas marcas do envelhecimento físico.

Dogmas e mais dogmas, doutrinas e mais doutrinas, aprisionando a alma dos homens a suas normas e regras castradoras do ser humano que busca sua liberdade e felicidade, que procura ser exceção aos padrões agregadores de rebanhos humanos, de fácil domesticação e controle. E eis que surge esse papa que nos mobiliza a participar ativamente dos processos de mudanças humanizantes, despertando vontades adormecidas e as convidando a cultivar  e expressar suas verdadeiras espiritualidades.

A perspicácia de seu diagnóstico e análise da crise do humano, do enjaulamento do amor que implode fechado no coração do homem na modernidade, tende a encontrar expressão no mundo pós-moderno ante a proposta do Papa Francisco para a formação da "Cultura do Encontro".

Nesse sentido, a ênfase recai na qualidade da espontaneidade do fenômeno amoroso, responsável pela sensação de êxtase e grande contentamento interno, energia construtiva  visando a conquista de dignidades pessoais, transvalorações de forças espirituais, que irradiam no acolher com o coração um ser amado especial, e outros seres humanos podem assim ser considerados.

Foi surpreendente constatar os efeitos do carisma pessoal e atuação funcional direta do Papa, nesse sentido. Ao acolher o "social" em seu coração, tem como resposta a busca da dignidade amorosa por parte de cada um que teve contato com ele.

Contatos e vínculos persistem com sua presença internalizada, ausente e distante fisicamente, sem exigências ou cobranças dessas pessoas que se sentem enlaçadas pela fé que, a meu ver, é uma convicção da alma, que propicia a cumplicidade e a confiança para uma entrega doadora de amor entre espíritos vinculados na sensibilização do verdadeiro sentir, com seu poder transformador e  potencializador, para a manutenção de formas sociais pacificadoras e unificadoras, sinalizando "o porvir de uma nova  humanidade".

De repente, ela já pode ser vislumbrada adentrando garbosa a pós-modernidade, estando, pois, bem mais próxima de nós do que muita gente poderia se aventurar a pensar.

Agora é ir se autoeducando para participar dessa nova humanidade, passando pelo processo de individuação, passo adiante da individualização, portanto, além da conquista da individualidade e do individualismo. Consiste no alcance de outro nível de consciência, sem perder a subjetividade com sua singularidade; e de uma outra amplitude perceptiva, mais harmônica em nosso mundo psíquico, por estar vinculado a liberdade de uma autodeterminação.

Primeiro é aprender a administrar as energias psíquicas depois de se autoconhecer, depois é aprender a se autolegislar... e ir mais além.

É criar valores próprios, reconhecer o surgimento de uma moral interna e  bancar essas singulares forças psíquicas imanentes, essas virtudes espirituais hierarquizadas por cada sujeito pois é patrimônio da cultura do encontro afetivo consigo mesmo. Essas forças, energias psíquicas ou valores, são mobilizadoras da dinâmica da vontade, do autêntico querer advindo direto de nossa alma, que impulsionam cada um a participar ativamente da vida e, principalmente, a "curtir esse viver".

Há algum tempo venho me paramentando para adentrar a nova era como gostaria ... e vocês, já sabem o que querem para suas vidas?


Aurora Gite

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