sexta-feira, 20 de novembro de 2015

O Impacto da Tirania do Momento

Li vários livros do sociólogo Zigmunt Bauman. Poucos deixei de reler! A maioria contou com meu breve retorno, buscando seguir as pistas das palavras-chaves grifadas e o caminho da "uniformidade das pessoas" agora na condição de mercadorias de consumo, como após ler "Vida para Consumo": a transformação de pessoas em mercadorias" - Rio de Janeiro, Zahar, 2008. Chamou minha atenção: "copyright 2007".

Nesse livro em particular recomendo a leitura do capítulo 3 - "A Cultura Consumista" (p.107). Bauman retrata a desconstrução do passado e seus valores e do futuro em sua visão empreendedora, a ilusão de liberdade e como esta atualmente é direcionada sem nossa percepção consciente, o marketing na formatação da identidade de novos "eus" adequados às necessidades inventadas conforme a exigência da demanda do consumo.

Bauman aborda com maestria a fabricação da sociedade consumista onde as pessoas se transformaram em mercadoria de consumo, o papel do marketing na construção desses "novos eus" em constante processo de reconstrução em virtude da volatilidade do mercado de pessoas. Segundo sua análise, vivemos a "Era do Movimento, da Liquidez no sempre Inovar, Tempo da Pressa no obter Resultados; vivemos sob o império da "Tirania do Momento" (p.121).

O autor observa e recorta com a perspicácia, que lhe é característica, o momento "internetizado e globalizado" e analisa as repercussões de suas consequências para a convivência humana e as interações sociais no mundo "on e offline". Foca as sociedades emergentes da "Era dos Simulacros, que não eliminou a diferença entre a própria coisa e seu reflexo, entre o real e as realidades virtuais, apenas cavou um precipício entre elas".

Bauman nos confronta com o processo da auto-identificação dentro de um design angustiante, pois não estamos tão livres como pensamos. Nossa razão nos engana muitas vezes. "Os vínculos humanos tendem a ser conduzidos e mediados pelos mercados dos bens de consumo, o sentimento de pertença não é obtido seguindo-se os procedimentos administrados e supervisionados por essas 'tendências de estilo' aos quais se aspira, mas por meio da própria identificação metonímica do aspirante com a 'tendência'." Sem dúvida, nossas necessidades são criadas e nossos desejos induzidos. Questiona se o desejo latente freudiano, sempre embasado em insatisfação ante a precariedade do prazer por objetos desejados alcançados, não seria mantido para ocultar essa dinâmica que descreve.

Destaca a "misteriosa proeza de desabilitar o passado ante a facilidade de renascer" , perene promessa da sociedade de consumo: infindável sucessão de novos começos, novas famílias, novas carreiras, novas identidades até por constantes mudanças por cirurgias plásticas, logo seguidas de insatisfação com as novas imagens. "A atual cultura cirúrgica promove a fantasia da plasticidade corporal infinita... A mensagem da indústria da reconstrução é de se reinventar da maneira que preferir... A cirurgia plástica não é para remover uma cicatriz ou alcançar uma forma ideal negada pela natureza ou pelo destino, mas para ficar em dia com padrões que mudam com rapidez, manter o próprio valor do mercado e descartar uma imagem que perdeu sua utilidade e seu charme, de modo que uma nova imagem pública seja colocada em seu lugar - num pacote que inclui (espera-se) uma nova identidade e (com certeza) um novo começo." (p.130)

Ledo engano! O vazio e a insatisfação logo se fazem presentes.
Bauman estende essa forma de raciocinar às escolhas idealizadas que fazemos dos nossos objetos de amor e a fragilidade dos vínculos amorosos assim estabelecidos. É preciso muita atenção para que o momento atual vivido na atualidade não seja contaminado pela "preocupação de hipotecar o futuro".

Bauman cita o livro de Thomas Hylland Eriksen sobre a "tirania do momento":
"As consequências da pressa extrema são avassaladoras: tanto o passado quanto o futuro como categorias mentais são ameaçados pela tirania do momento... Até o 'aqui e agora' é ameaçado, já que o momento seguinte chega tão depressa que se torna difícil viver no presente." (p.134)

Com esta frase, peço "time"! Peço uma pausa para profundas reflexões sobre as análises de Bauman e como umas das maiores buscas atuais volta-se para a inclusão e o reconhecimento público, mais do que à autovalorização e orgulho interno para as próprias autorrealizações. Realço suas convicções e afirmações de que o ser humano não é tão livre quanto pensa ser, pela forma com que sua liberdade de escolher as maneiras de seu agir está vinculada às "tendências e estilos ditados pela vida consumista do momento atual da sociedade contemporânea".

Vale ler "Vida para Consumo: a transformação das pessoas em mercadorias" e investigar se passou pelo campo de concentração do "mercado consumista" e pelo forno do gás mortífero às identidades construídas com orgulho. O objetivo é o "sequestro de inteligências" e o enquadrar qualquer subjetividade na formatação uniforme visando transformar as pessoas em mercadorias a serem consumidas de acordo com as tendências do mercado. É um livro rico para profissionais que lidam com recursos humanos em empresas!


Para os que duvidam da "sincronicidade" a nosso redor, assistam a entrevista com o sociólogo, presidente do IPEA, Jessé Souza e suas ideias sobre o "sequestro da inteligência". Entrevista com Mário Sérgio Conti em globosatplay.globo.com/globonews/v/7621714/. Novas articulações de ideias sob novas perspectivas, coincidentemente próximas das de Zigmunt Bauman. Vale conferir!

Tomei conhecimento dessa entrevista, ao terminar essa postagem. Coincidência? Simples acaso? É para se pensar a respeito, levando em consideração as novas descobertas sobre a condição humana.
Já anotei, como minha próxima aquisição, o livro de Jessé Souza, lançado nesse final de novembro: "A Tolice da Inteligência Brasileira", Editora Leia, 2015.

Lucia Thompson

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