sexta-feira, 17 de abril de 2009

E agora, José?

O que mais me acalenta, nessa nova era informatizada, é constatar que a rapidez e transparência nas comunicações nos impulsiona a uma postura mais voltada ao confronto com situações verdadeiras, a ações direcionadas a ética e ao combate a uma lentidão na aplicação da justiça. Fiscalizações e confirmações da legitimidade de informações ganharam diferente "status" decorrente do imediatismo das contestações e da ousadia da mídia em suas divulgações.

Três perspectivas e novo alento... três artigos... três vivências diferenciadas... Assim mesmo é muito bom saber que não se está sozinho na luta em prol de uma sociedade com melhor qualidade de vida formada por "cidadãos éticos".

No Estadão, de 15/04/2009, em coluna de seu Espaço Aberto, meu peito encheu-se de orgulho ao ler as declarações do superintendente de um grande complexo hospitalar, do qual cheguei a fazer parte, pontuando seus avanços, "frutos de um importante processo de amadurecimento". Segundo o mesmo metas foram atingidas com excelência, quais sejam o atendimento à população menos favorecida, o ensino universitário e o desenvolvimento de pesquisas científicas. Realça a transformação no campo do conhecimento científico visto que tornaram-se "pesquisas aplicadas tanto no que se refere às inovações no tratamento de doenças, como no aperfeiçoamento de aparelhos e equipamentos". Enfatiza que, passados 65 anos de sua criação, sem descuidar dessas três frentes, acabou sendo desenvolvida nessa gestão outra "marcante característica: a de hospital pioneiro".
Comenta sobre as mudanças estruturais e de gerenciamento visando o acolhimento e respeito aos pacientes e intensificando o trabalho de humanização no atendimento.

Confesso que sempre questionei o emprego do termo "humanização", ainda confuso para muitos e para "muitos" profissionais. Idéias... palavras... mas na prática como bancá-las? Mudanças estruturais realmente ocorreram, mas na hora de operacionalizá-las a contento ...

Em 17.04.2009, a Folha de São Paulo, nos traz a notícia do afastamento "temporário" de um médico neurocirurgião responsável pelo plantão controlador de vagas, do mesmo complexo hospitalar, para que pudesse ser "melhor treinado para sua função". O mesmo havia enviado um ofício ao SAMU e ao Corpo de Bombeiros pedindo "para que pacientes com politraumatismo graves não fossem levados ao hospital por conta da superlotação". Ousou nas justificativas transparentes abordar a difícil situação operacional no tratamento emergencial (Pronto-Socorro) do referido hospital: " dezenas de macas no corredor, falta de vagas na UTI, mesas de cirurgias ocupadas por pacientes por falta de leitos nos quartos e fila de espera para cirurgia de emergência". Esse é o quadro que conheci e é ainda o espelho do que ainda ocorre no país na área da saúde, segundo constantes divulgações midiáticas.

Coincidência seu afastamento ter ocorrido após haver tomado as medidas acima? Melhor treino para que função?

O que ocorreu com esse profissional? Honestidade ética consigo mesmo, lealdade a seu juramento médico, cumplicidade com as metas sob as quais o hospital foi criado, pioneirismo com o compromisso da transparência tão apregoado, ingenuidade na luta por transformações concretas?

Tudo isso eu conheço. Trilhei esse caminho e não aceitei fazer parte dos séquitos dos "reis nus". Mudanças só ocorrem quando, com humildade e tolerância, nos permitimos observar os pontos fortes e também os falhos a nossa volta, para que possamos transformá-los. Só assim nos impedimos de vestir belas e luxuosas roupagens falaciosas propostas muitas vezes por nossas assessorias. No caos ético do mundo atual a primeira transformação tem que vir dos líderes e chefias, para que possam atrair seguidores fiéis e disponíveis a operacionalizar efetivamente as mudanças que propõem.

Agora retorno ao Estadão de 08.04.2009, e ao artigo intitulado "Por uma ética planetária" e com orgulho cito seu autor : Dr. Raul Marino Jr. - professor titular emérito de Neurocirurgia e professor livre-docente de Ética Médica e Bioética da Faculdade de Medicina da USP. Após tecer considerações sobre as ciências da Ética, Moral e Bioética e suas aplicações no campo da Antropologia e Sociologia, da Filosofia e da Psicologia, das Neurociências, das Ciências Políticas, da Teologia...cita as dificuldades de sua inserção prática nas grandes instituições. " Fugindo da burocracia intransponível dos órgãos governamentais, temos procurado universidades e faculdades privadas e outras instituições que disponham espaço para ... discussões de dilemas éticos e morais... parece que a ética e a moral são assuntos muito incômodos e mal vistos no Brasil. Quase todas as universidades as têm retirado de seu currículo, mesmo as de cursos superiores como Medicina, Direito, Engenharia e tantas outras, considerando-as apenas como curiosidades filosóficas ou filantrópicas".

Termino esse blog com as palavras finais de seu artigo: "...ou seremos éticos e morais neste milênio que se inicia, ou não seremos nada! " . E agora, José?

Aurora Gite

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